CÂMARAS JULGADORAS
DECISÃO NA ÍNTEGRA


Boletim TIT 295/96, de 21-9-96 - DOE 21-9-96

VARIAÇÃO CAMBIAL

- BASE DE CÁLCULO
- ENTRADA DE MERCADORIAS IMPORTADAS DO EXTERIOR
- INDEVIDA EXIGÊNCIA DO IMPOSTO EM DECORRÊNCIA DA DIFERENÇA OCORRIDA NA VARIAÇÃO CAMBIAL ENTRE O DESEMBARAÇO E O POSTERIOR FECHAMENTO DO CONTRATO DE CÂMBIO
- PROVIDO O RECURSO
- DECISÃO UNÂNIME

1. Após uma série de incidentes processuais, provocados, principalmente, pela inusitada utilização de embargos de declaração, fundamentada na aplicação subsidiária do artigo 535 do Código de Processo Civil, tornam os autos a este Tribunal, via do apelo revisional interposto pela autuada, desta feita, para apreciação pelas Câmaras Reunidas.

2. Trata-se de controvérsia em torno da base de cálculo do ICM devido pela entrada de mercadoria importada e utilizada como matéria-prima na fabricação de produtos objeto de saídas não sujeitas ao tributo.

3. O Fisco assenta sua exigência na tese de que a expressão taxa cambial efetivamente aplicada em cada caso, contida no inciso IV do artigo 2º do Decreto-Lei nº 406, de 31-12-68, repetida, literalmente, na redação do inciso IV do artigo 19 da Lei local nº 440, de 22-9-74, e no inciso IV do artigo 27 do RICM/81, há de ser entendida como a taxa constante do contrato de câmbio, entendimento que, ao seu ver, não desborda do artigo 143 do CTN, que determina a conversão da moeda estrangeira ao câmbio do dia da ocorrência do fato gerador da obrigação, mas, ressalva disposição da lei em contrário.

4. A recorrente, por seu turno, fixa-se na tese de que a taxa cambial a ser aplicada é a vigente ao tempo do desembaraço aduaneiro, que serve, também, de base para o cálculo dos Impostos de Importação e de Produtos Industrializados e que a pretensão da Fazenda leva à tributação de flutuação cambial, o que é vedado aos Estados, por ser de competência exclusiva da União, nos termos do inciso VI do artigo 21 da C.F./69.

5. A matéria foi apreciada, em grau de recurso ordinário, pela 5ª Câmara Especial, em sua constituição anterior, que, à unanimidade, placitou o voto do Relator, Dr. Ari José Brandão, que negou provimento ao recurso, por entender que a razão está com o Fisco.

6. Vislumbrando contradição entre os fundamentos e a conclusão do acórdão, a autuada interpôs, inusitadamente, até porque já estava esgotada, por decurso dos prazos recursais, a instância administrativa, embargos de declaração, invocando aplicação subsidiária do artigo 535 do Código de Processo Civil. Repelido na primeira tentativa, o inusitado recurso foi renovado e acolhido como esclarecimento de julgado, nos termos do artigo 534 do RICM, por respeitável despacho do então Presidente desta Corte, que o distribuiu à 1ª Câmara, onde foi conhecido como Pedido de Retificação de Julgado, mas, desprovido, por votação unânime.

7 O pedido de revisão aponta como divergente o acórdão prolatado pela 6ª Câmara Especial no processo DRT-6 nº 5108/87, em nome da mesma autuada, de que foi relator o Juiz, Dr. Moacyr Mesquita Cavalcante, que, por unanimidade, acolheu a tese da recorrente, cancelando a exigência fiscal, sob o fundamento fulcral de que o contrato de câmbio não é documento de importação, nem dele faz parte e usá-lo como fonte da base de cálculo do ICM é tributar correção monetária de forma oblíqua.

8. A Representação Fiscal manifestou-se na pessoa do Dr. Elídio Ramires, opinando, preliminarmente, pela rejeição do pedido, por interposto extemporaneamente, visto que, a decisão recorrida foi publicada em 11-10-89 e o apelo revisional só foi protocolado em 30-01-91. E mesmo considerando que os embargos foram recebidos como esclarecimento de julgado, nos termos do artigo 534 do RICM/81, não há como convalidar-se a preclusão do prazo exaurido, quer pela ausência de amparo legal, quer porque da retificação de julgado não cabe recurso. No mérito, propugna pelo desprovimento, por caracterizada nos autos a infração cometida, invocando, como precedente, decisão favorável à tese fazendária, cuja ementa constou sob nº 450 do Ementário TIT/90, página 203, assim redigida:

“IMPORTAÇÃO - matéria-prima -ICM recolhido a menor em razão de haver o contribuinte utilizado a taxa cambial vigente à data da entrada da mercadoria, inferior à efetivamente aplicada no caso - Legítima exigência fiscal da diferença - Recurso ordinário desprovido. Decisão unânime” (Proc. DRT-4 nº 9964/84, 6ª Câmara - Rel. Luiz Sérgio Soares).

9. É o relatório.

VOTO

10. Com a Representação Fiscal, entendo que o pedido de revisão realmente é extemporâneo, pelos próprios fundamentos que alinhou em seu parecer. Não obstante, invoco o princípio da equidade para conhecê-lo, nos termos do artigo 5º do Regimento Interno, visto que presentes os demais requisitos para a sua admissibilidade. É que a decisão revisanda, se não contém contradição implícita, no mínimo, é de difícil intelecção, justificando, plenamente, o Esclarecimento de Julgado, sem o que, estaria o recorrente em dificuldade para, com firmeza, formular o seu recurso. De se conhecê-lo, portanto, em homenagem ao sagrado princípio constitucional da ampla defesa.

11. A questão que se submete a este Plenário, objetivando a uniformização dos julgados, é a de se saber qual a taxa cambial a ser aplicada na conversão da moeda estrangeira para a nacional, para definição da base de cálculo na entrada de mercadoria importada do exterior, em face do disposto no artigo 19, inciso IV, da Lei nº 440, de 24 de setembro de 1974, regulamentado pelo artigo 27, inciso IV, do RICM/81, “verbis”:

“IV - no caso do inciso II do artigo 1º, a base de cálculo é o valor constante dos documentos de importação, convertido em cruzeiros à taxa cambial efetivamente aplicada em cada caso, acrescido do valor dos Impostos de Importação e sobre Produtos Industrializados e demais despesas aduaneiras efetivamente pagas.”

12. A matéria já foi objeto de apreciação do Plenário, em sua constituição anterior, pelo menos, em duas oportunidades, mas não logrou pacificação. No processo DRT-5 nº 3903/82, foi sufragada, por apertada maioria, a tese defendida pelo Relator, Dr. Paulo Celso Bergstron Bonilha, no sentido de que a norma em foco constitui exceção à regra geral do artigo 143 do CTN, sendo legítima a exigência da diferença do imposto com base na variação da taxa cambial até o fechamento dos contratos de câmbio, posterior à data dos respectivos fatos geradores. Em outra oportunidade, o Plenário rejeitou, também por estreita maioria, a mesma tese, desta feita, defendida pelo Juiz, Dr. Hypérides Toledo Zorzella, relator do Revisional no Processo DRT-6 nº 5108/87.

13. Há que se admitir que o dispositivo em questão, tal como redigido, é de difícil inteligência e apenas a análise sistemática da legislação então vigente não oferece adminículos suficientes para se colher uma inferência estreme de dúvida.

14. Tenho para mim que a solução da controvérsia exige, também, investigação histórica do dispositivo e invocação do princípio basilar do lançamento, que deve se ater às circunstâncias fáticas e jurídicas existentes na data da ocorrência do fato gerador - “tempus regit factum”.

15. A Lei nº 9.590, de 30-12-66, que instituiu o ICM no Estado de São Paulo, com apoio nos artigos 52 e seguintes do CTN, não contemplava a entrada da mercadoria importada do exterior como fato gerador. Por isso que, ao tratar da base de cálculo, dispôs no parágrafo 3º do artigo 7º:
“Parágrafo 3º - O valor da operação será calculado em moeda nacional; quando expresso em moeda estrangeira, far-se-á a conversão à taxa utilizada no fechamento do contrato de câmbio ou, na falta deste, à taxa do dia da saída da mercadoria do estabelecimento, somadas, em qualquer caso, as importâncias relativas a bonificações ou outras vantagens a qualquer título auferidas pelo contribuinte” (grifei).

16. Como se vê, quando o legislador quis que o referencial fosse a taxa do fechamento do contrato de câmbio, ele o fez expressa e cristalinamente. E quando a lei complementou o comando, estabelecendo que na falta do contrato de câmbio fosse utilizada a taxa cambial do dia da saída da mercadoria, deixou claro que o que se pretendia como base de cálculo era a conversão antecipada, ou, a conversão na data da ocorrência do fato gerador. É óbvio que só se cuidava, na hipótese, de exportação e o contribuinte pátrio é que recebia o preço, fechado, de regra, antecipadamente.

17. Essa situação perdurou até o advento do Decreto-lei nº 406, de 31-12-68, que foi incorporado à legislação de São Paulo pelo Decreto nº 51.345, de 31-01-69, não obstante o A.C. nº 34, de 30-01-67, já tivesse erigido a entrada de importados como o fato gerador do ICM e o artigo 5º do A.C. nº 35, de 28-02-67, de efêmera duração, tivesse fixado como base de cálculo o mesmo valor utilizado para o Imposto de Importação.

18 Interessante observar que a Lei nº 440/74 ao estabelecer a controvertida base de cálculo em seu artigo 19, inciso IV, procurou explicitar, no parágrafo 9º, a hipótese de ser desconhecida na data da ocorrência do fato gerador, a taxa cambial efetivamente aplicada em cada caso, determinando a utilização da taxa empregada para pagamento do I.I. Observa-se que o legislador toma como referencial a data da ocorrência do fato gerador e usa o verbo aplicar no pretérito - taxa cambial efetivamente aplicada - o que faz supor estar-se referindo à data do desembaraço aduaneiro, visto que, os valores a serem considerados são os constantes dos documentos de importação (D.I.).

19. Referido dispositivo ainda estabeleceu que se a mercadoria importada não se destinar a subsequente operação tributada deverá o importador recolher eventual diferença, quando vier a conhecer o valor definitivo da taxa cambial, ficando dispensada desse recolhimento se houver subsequente operação tributada. Ora, a prevalecer o entendimento de que a taxa é a constante do contrato de câmbio pode ocorrer o absurdo de o valor do tributo a ser pago pelo custo vir a ser maior que o devido pela venda da mesma mercadoria, em decorrência da “leucêmica inflação que assola desabridamente a economia brasileira”, na expressão do Relator do paradigma colacionado. Basta que o contrato seja fechado algum tempo depois da importação e a mercadoria vendida logo em seguida, com pouca margem de lucro.
20. Para bem se entenderem as regras da base de cálculo em relação às mercadorias importadas não se pode deslembrar das diversas hipóteses de importação e das respectivas regras quanto ao local, forma e prazos de pagamento, elencadas no artigo 69, incisos VI e VII, parágrafos 1º e 2º, e artigo 71, inciso I, alíneas “a” a “c” do Regulamento. Também se deve ter presente que a importação não se faz em uma só moeda estrangeira.

21. Assim, a expressão “taxa cambial efetivamente aplicada em cada caso” está condicionada à conversibilidade das diversas moedas estrangeiras nos prazos de recolhimento definidos no Regulamento, tendo como limite, a data da ocorrência do fato gerador.

22. Vale registrar que a legislação do ICMS, livre do jugo do Decreto-lei nº 406/68, abandonou a esdrúxula redação para dispor, de forma direta e transparente, que a taxa cambial a ser aplicada, no caso, é a do dia da ocorrência do fato gerador, em perfeita sintonia com o artigo 143 do CTN (vide artigo 32 da Lei nº 6.374/89).

23. Finalmente, um argumento de fecho. No erudito voto a que me referi atrás, o Prof. Paulo Bonilha sustentou brilhantemente a tese da taxa cambial do fechamento do contrato de câmbio, encarando a lei paulista como exceção perfeitamente prevista no próprio artigo 143 do CTN e afirmando, com invocação do magistério do insigne Souto Maior Borges, que podem os Estados-membros legislar sobre a conversibilidade do valor tributável, para o lançamento de seus próprios tributos, não sendo exclusividade da União regular a conversão cambial prevista na ressalva do artigo 143, 1ª parte.

24. Este argumento, ao meu ver, perfeito, labora em favor da tese do recorrente. Com efeito, ao estabelecer que o imposto deve ser recolhido antes do desembaraço aduaneiro, o que significa, antes da ocorrência do fato gerador, com observância da taxa cambial efetivamente aplicada em cada caso, a legislação paulista valeu-se, exatamente, da exceção prevista no mencionado artigo 143. Assim o fez, também, no caso da exportação, cujo momento da conversão da moeda estrangeira só passou à regra geral do dia do fato gerador, com o advento da Lei nº 4.470, de 19-12-84, sob o fundamento de que o fechamento antecipado do câmbio causava prejuízo para a arrecadação (vide Exposição de Motivos que acompanhou o Projeto de Lei nº 786, de1984,anotado pelo atento Dr. Luiz Álvaro Fairbanks de Sá, em seu voto em separado no Processo DRT-5 nº 3903/82).

25. Com estes fundamentos, meu voto é no sentido de conhecer, por equidade, o pedido de revisão para, no mérito, dar-lhe provimento.

Plenário Antonio Pinto da Silva, 16 de julho de 1992.

a) Cézar Augusto Moreira, Relator

Resumo da Decisão - Pedido de Revisão - Provido o recurso - Decisão não unânime - Câmaras Reunidas - Proc. DRT-6 nº 5066/87.



Comandos auxiliares:

  • Voltar à página anterior: "clicar" a tecla Back no topo da tela.
  • Voltar ao Índice Principal
  • Solicitar ajuda

    Elaboração:
    Luiz Antonio Castelo Branco (AFR - Assistente Fiscal da DIPLAT)
    José Antonio Moraes Salles (AFR - Assistente Fiscal da CT)

    Colaboração:

  • AFRESP - INTERNET - http:www.afresp.com.br
    Av Brigadeiro Luiz Antonio, 4.843 - São Paulo - SP - CEP 01401-002
  • Assistência da Legislação Tributária - ALT, órgão da Consultoria Tributária - CT
    Av. Rangel Pestana, 300 - 11 andar - 233-3469 - CEP 01091-900 - São Paulo - SP

    A reprodução deste trabalho poderá ser efetuada mediante prévia e expressa autorização da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo ou AFRESP












    CÂMARAS JULGADORAS
    DECISÃO NA ÍNTEGRA


    Boletim TIT Nº 311/97, de 09/07/95 - DOE 6-12-97

    BASE DE CÁLCULO

    IPI - Não inclusão na base de cálculo
    - Comercialização de produtos industrializados realizada por estabelecimento equiparado a industrial
    - Negado provimento Ao Pedido de Revisão da Fazenda
    - Decisão não unânime.

     

    RELATÓRIO

     

    A autuação vestibular continha quatro itens, tendo o contribuinte reconhecido a procedência dos três últimos e providenciado o recolhimento dos respectivos débitos.

    Dessarte, a Colenda Câmara apreciou apenas a controvérsia instaurada em relação ao item 1 do Auto de Infração, no qual a fiscalização vislumbra erro na determinação da base de cálculo aplicada em diversas operações porque o contribuinte, estabelecimento equiparado a industrial, não incluiu o IPI no valor oferecido à tributação.

    Contra a decisão unânime, relatada pelo eminente juiz Rubens Malta de Souza Campos Filho, que deu provimento ao apelo do particular, a Representação Fiscal interpõe recurso revisional colacionando diversos precedentes em que o julgamento foi radicalmente oposto.

    Embora regularmente notificado, o contribuinte não apresentou resposta ao aludido recurso.

    É o relatório.

    VOTO

    Conheço do recurso, pois demonstrada a divergência entre os critérios de julgamento mobilizados pelo acórdão recorrido e aqueles utilizados nos paradigmas trazidos a confronto.

    A matéria é bastante conhecida e desde logo registro meu entendimento de que não há, data vênia, inconstitucionalidade no art. 24, § 1º , item 4, da Lei 6.374/89, norma em que se fundamenta a pretensão fiscal.

    Não se desconhece o pronunciamento do Tribunal de Justiça de São Paulo no Incidente de Inconstitucionalidade de Lei suscitado na Apelação Cível nº 162.265-2. Todavia, é importante obtemperar que, nos termos da Constituição Estadual e do Regimento Interno do próprio TJ, referido Pretório não tem competência, a não ser incidentalmente, para declarar a inconstitucionalidade de Lei Estadual perante a Constituição Federal. O aludido julgamento, nessa cadência, não tem efeito vinculativo, conforme já assentado pela 14ª Câmara Civil ao deslindar a Apelação Cível nº 192.384-2:

    "O v. acórdão (fls. 362/364) declarou inconstitucional o art. 24, § 1º, nº 4, da Lei Estadual nº 6.374/89 - em Incidente de Inconstitucionalidade na Apelação Cível nº 162.265-2-SP e, sendo prejudicial incidental naquele processo, é ininvocável aqui - apenas fazendo res iudicata intra processual lá (art. 469, CPC)."

    O eixo do debate consiste em saber se a previsão constitucional - excepcional - de exclusão do IPI da base imponível alcança também, além dos contribuintes do tributo federal propriamente ditos, os estabelecimentos equiparados a industrial .

    O magistrado Eros Picelli, quando ainda titular da 2ª Vara da Fazenda Pública, ensinou que:

    "Não há igualdade entre duas pessoas ou coisas quando se impõe que a lei reconheça a semelhança ou a equiparação. Ou se é igual ou se é equiparado. Não há como atribuir a condição de semelhante à matriz."

    Realmente, só se equipara aquilo que é diferente, não o que é igual.

    Nesta linha de raciocínio, parece-me claro que o legislador constituinte, ao editar a paradigmática regra do art. 155, § 2º, inciso XI, tinha em mente estabelecer regra aplicável aos estabelecimentos industriais, contribuintes do IPI, e não conceder uma espécie de "cheque em branco" ao legislador federal, dotando-o de extraordinário poder para submeter a legislação estadual.

    Tais argumentos adquirem robustez ainda maior quando se verifica que a equiparação de certas filiais atacadistas a estabelecimentos industriais não deriva sequer de lei, mas de mero Regulamento federal (o do IPI ), afigurando-se inadmissível que a lei estadual - responsável pela instituição e disciplina do ICMS - esteja obrigada a acatar tal ficção.

    A lei estadual não deve obediência a regulamentos federais, mas à Constituição. Nesta, a previsão de exclusão do IPI se refere unicamente aos contribuintes desse tributo, vale dizer, os estabelecimentos industriais. A "mens legis" é clara, não se aceitando que uma ficção - a equiparação, por definição, o é - possa alterar o escopo da norma, alargar o benefício fiscal e, ao cabo, obrigar a lei estadual.

    Acolher a propalada tese da inconstitucionalidade implica admitir descabida ingerência da legislação federal no campo estadual, ferindo a atribuição de competências perpetrada pela Lei Maior, segundo a qual cabe aos Estados (art. 155, I, "b") instituir e disciplinar o ICMS (note-se que o preceito constitucional evocado pela recorrente se insere no capítulo reservado ao tributo estadual), detendo, nesse mister, competência legislativa plena (art. 24, inciso I e respectivos parágrafos), somente limitada, e apenas concorrentemente, pela competência da União de fixar normas gerais.

    É evidente que a discutida "equiparação" não pode ser considerada "norma geral" apta a submeter o legislador estadual.

    Digno de realce, neste ponto, que o acórdão colacionado pela autuada procura se embasar na afirmação de que "Contribuinte do IPI são todos, indistintamente, definidos no CTN" (sic). Ocorre que o CTN não contém nenhuma previsão de que estabelecimentos equiparados a industriais sejam contribuintes do IPI. Logo, partindo do mesmo raciocínio que norteou o veredito em tela, tem-se, logicamente, que a ausência de previsão no CTN denota que os estabelecimentos equiparados não podem ser considerados contribuintes para efeito de sujeição da lei estadual.

    Este o entendimento da 15ª Câmara Civil do próprio Tribunal de Justiça, como exemplifica o acórdão referente à apelação nº 155.709-2:

    " A pretensão da Impetrante, no entanto, não merece acolhida, ante o desate dado à espécie pela bem lançada sentença recorrida. Nela se proclamou, com acerto, que inexiste a pretendida equiparação de estabelecimento comercial e industrial, o que torna impossível obrigar-se o Estado de São Paulo a aceitar a invasão de sua competência exclusiva para legislar o ICMS pela União Federal. Como bem observou a impetrada (Fazenda do Estado), a equiparação pela qual se bate a recorrente foi instituída na órbita legislativa federal (IPI), não podendo compelir legislação relativa a outra pessoa jurídica de direito público".

    Com efeito, caso acolhida a tese em debate, estaria restabelecida a possibilidade da União isentar, ainda que parcialmente, o tributo estadual, em flagrante violação ao disposto no art. 155, inciso III, da vigorante Constituição.

    Oportunas, a propósito, as ponderações da 11ª Câmara Civil (apelação nº 155.740-2):

    "Mas, neste ponto, também, a lei estadual harmoniza-se com a Constituição Federal.É que a simples equiparação de um estabelecimento a industrial, para fins de pagamento do IPI, não pode importar em incidência do inciso XI do art. 155 da Constituição da República, pois isto importaria em conferir à União a competência de, por via indireta, instituir isenção parcial do ICMS, através da redução da base de cálculo deste imposto. Isenções do ICMS, a Constituição as reserva à deliberação dos Estados e do Distrito Federal. É o que se vê da letra "g" do inciso XII do art. 155 da Lei Maior."

    A 13a Câmara Civil compartilha do mesmo enfoque, como asseverou ao decidir a apelação cível nº 184.853-2:

    "A mudança ocorrida no sistema tributário, por força da vigente Constituição, autoriza o procedimento fazendário, contra que se volta a recorrida. É que, basicamente, isenções de tributos de competência dos Estados, somente os Estados podem instituir, uma vez que é vedado à União fazê-lo (art. 151, III, C.Fed.) (...) Para isso não estava o Estado de São Paulo impedido, porque a equiparação não pode representar expediente destinado a criar uma isenção vedada pela Carta Magna."

    Face ao exposto, pelo meu voto dou provimento ao recurso revisional da Fazenda, porque não vislumbro nenhuma irregularidade na norma estampada no art. 24, § 1º, item 4, da Lei paulista nº 6.374/89.

    Plenário, 27 de julho de 1995.

    a) Paulo Gonçalves da Costa Junior, Relator.

    VOTO EM SEPARADO

    1. Restam os autos conhecidos sobre a acusação de falta relativa ao recolhimento do imposto em razão da exclusão do valor do IPI da base de cálculo do ICMS pelo estabelecimento equiparado a industrial pela legislação federal.

    2. O presente pedido de revisão teve por Juiz-relator designado Dr. Paulo Gonçalves da Costa Júnior que, após o relato e devida fundamentação, concluiu pelo conhecimento e provimento do recurso apresentado pela I. Representação Fiscal acolhendo a acusação determinada em razão de erro na fixação de base de cálculo para recolhimento do ICMS, na qual não se incluiu o valor correspondente ao IPI.

    3. Impecavelmente colocado, responde a trazida colação do julgamento do Incidente de Inconstitucionalidade resolvido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, citando inúmeros julgados do mesmo Sodalício decidindo em sentido oposto e em abono à posição trazida pelo pedido de revisão então conhecido.

    4. Pedi vista dos autos para examinar o caso, sendo certo que acompanho o voto do I. Relator, defendendo, também, o conhecimento e provimento ao pedido da I. Representação Fiscal.

    5. Também entendo, na mesma esteira do que aqui decidido e como declarado nos votos paradigmas trazidos para confronto, que a determinação da base de cálculo das operações que envolvam mercadorias de contribuintes equiparados a "industriais" pela lei federal relativa ao IPI, sujeita-se especificamente às disposições do artigo 39, § 1º, pela especificação do item "4" do RICMS estadual, "in verbis" :

    "... Incluem-se na base de cálculo:

    .....................................................

    4. o valor do Imposto sobre Produtos Industrializados na operação realizada por estabelecimento simplesmente equiparado a industrial pela legislação relativa ao imposto federal."

    Temos, pois, que a regra constitucional sobre a composição da base de cálculo do ICMS nos termos do art. 155, § 2º, inc. XI, é reproduzida no RICMS/D. 33.118/91, art. 39, § 1º, item "3", e completa-se pela disposição consignada no mesmo dispositivo, pelo seu item "4".

    7. A legitimidade da previsão tem fundamento na autonomia estabelecida pelo ordenamento político do Estado brasileiro, que concede à União, aos Estados e aos Municípios a atribuição da competência tributária exclusiva, como nela disciplinada, garantida pela competência legislativa originária ou supletiva para determinar a ordem de seus interesses - artigo 24.

    Esse princípio de administração política instalado pela norma constitucional, que permite a cada entidade tributante a regulamentação de seus tributos, inibe, na mesma proporção, a interferência obrigatória ou efeitos de regras determinadas e destinadas por qualquer das esferas sobre as demais.

    Considerando que a norma buscada pelo contribuinte autuado para aplicação neste caso concreto é de ordem federal para disciplinar incidência tributária de competência da União quanto ao IPI, não poderá o comando de seus mandamentos alcançar as relações tributárias estaduais, sob pena de quebra da hegemonia estadual.

    8. Relativamente à disciplina própria do referido Decreto Federal que estabelece a equiparação de certos estabelecimentos a "industriais", para fins de cobrança de IPI, cabem as seguintes observações:

    8.1.que o decreto federal é anterior ao texto constitucional de 1988, que inovou na regra da composição da base de cálculo do ICMS relativamente ao valor do IPI incidente sobre a mesma mercadoria;

    8.2. que a atribuição constitucional da competência tributária reserva exclusividade quanto à instituição de "impostos" entre as várias entidades tributantes, restringindo a ingerência desonerativa entre essas mesmas esferas no quanto à competência de cada qual;

    8.3. que, pela Constituição, compete exclusivamente à lei complementar as disposições sobre conflitos de competência em matéria tributária, limitações ao poder de tributar e determinação de normas gerais pertinentes.

    A consideração desses pontos fundamentais e precedentes à própria questão concreta, leva a admitir a legitimidade da incidência consignada pela lei paulista, competente tributária e legislativamente para determinar a base de cálculo de seus impostos dentro da letra estrita do permissivo constitucional e sem afrontá-la, desconsiderando a disposição de decreto federal pertinente à matéria reservada e estrita a tributo de competência da União, que desde 1982 serve para regrar a incidência do IPI, no quanto particularmente estende a abrangência do conceito de "contribuinte" para fins dessa sua incidência tributária típica.

    9. Por esses fundamentos, reconhecendo essa competência da legislação estadual para disciplinar os elementos de composição dos impostos que lhe cabem, respeitados os contornos e limites constitucionais, entendo legitimada a previsão da composição de base de cálculo como estabelecida pelo RICMS, alcançando os produtos dos estabelecimentos simplesmente equiparados a industriais para fins de IPI.

    10. Isto posto, acompanho o I. Juiz - relator, conhecendo do pedido de revisão da I. Representação Fiscal para, no mérito, dar-lhe provimento, mantendo o trabalho inicial.

    TIT, Plenário, 05 de setembro de 1995.

    a) Eliana Maria Barbieri Bertachini, Juíza com voto em separado.

     

    VOTO EM SEPARADO

     

    Pedi vista destes autos para poder melhor expressar meu entendimento acerca da matéria jurídica em debate, qual seja, a legitimidade ou não da inclusão do valor do IPI na base de cálculo do ICMS, quando das operações de saída de mercadorias promovidas pelos estabelecimentos equiparados a industriais.

    A - DAS CONSIDERAÇÕES GERAIS

    2. Para bem situar a questão, não se pode perder de vista ser o Brasil uma República Federativa, onde coexistem pessoas de ordem pública distintas - União; Estados e o Distrito Federal; Municípios -, todas autônomas, com competências tributárias exclusivas e indelegáveis, no tocante aos impostos, constitucionalmente estabelecidas.

    3. Em outras palavras, a própria natureza da República Federativa do Brasil impõe rígida distribuição dos impostos entre os entes tributantes; se assim não fosse, estaria instaurado o caos jurídico, com a possibilidade de bitributação e de invasão de competências, afetando garantia assegurada pelos Estados de Direito ao cidadão-contribuinte e ameaçando a indissolubilidade do próprio regime federativo. É por essa razão que a matéria é de ordem constitucional, dela só podendo cuidar a Constituição Federal. A propósito, preleciona Pedro Salvetti Netto: "Não seria possível admitir a autonomia dos Estados federados, se não se lhes propiciassem recursos financeiros com que atendessem às suas despesas. Ora, a receita pública se consegue por meio dos tributos, gênero (..) de que são espécies, notadamente, os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria. Criando os tributos, deve a Constituição prever-lhes a distribuição entre as unidades políticas que formam o estado federal. Cumpre-lhe partilhá-los então, entre a União e os Estados, e ainda os Municípios, para que cada um deles possua os recursos necessários a sua vida financeira. Nada realmente, nada mais nos limita a independência do que a sujeição econômica" (in "Curso de Teoria do Estado", Saraiva, 6ª ed., 1984, p. 72).

    4. Portanto, e no tocante aos impostos referidos, IPI e ICMS, aquele federal e este estadual, respectivos entes tributantes têm o poder de instituílos da forma que entendam melhor, desde que respeitados os lineamentos constantes da Constituição Federal, o que por si só impede que a legislação ordinária particular a um desses impostos surta efeitos que impliquem limitação dos direitos e poderes do outro ente tributante, entre os quais o de instituir o tributo de sua competência e o de arrecadá-lo integralmente.

    5. Essa agressão não é possível, nem por lei ordinária, nem por lei complementar à Constituição. Esta afirmativa tem escora no magistério de José Soto Maior Borges (in "Lei Complementar Tributária", Rev. Tribunais / EDUC, SP, 1975), cujas palavras destacamos: "Temos portanto que a competência está de ordinário constitucionalmente repartida em compartimentos estanques, representados pelos campos privativos de legislação da União, Estados-membros e Municípios. A área de competência legislativa de uma pessoa constitucional não pode ser, de regra, explorada por outra. E, precisamente porque os poderes legislativos federal, estadual e municipal extraem as suas competências diretamente da Constituição, será inconstitucional lei que discipline matéria extravasante da área que lhe é própria (fls. 16). A classificação das leis em federais, estaduais e municipais não é estabelecida em função de considerações de hierarquia, mas apenas atende à maior ou menor extensão do seu âmbito material. Analisando os dois planos da federação brasileira, o da Constituição e o da legislação ordinária, sustentou excelentemente Pontes de Miranda não ser possível afirmar que abaixo da Constituição venham as leis federais nem - tampouco - as Constituições Estaduais: ‘Umas e outras vêm em seguida, dentro das linhas demarcadoras das competências legislativas (federal, estaduais), de acordo com o que se estatuiu na Constituição Federal’(fls. 17). Chegados ao presente estágio da nossa exposição resta indagar, para a correta formulação do problema, se as leis complementares, ao contrário do que sucede no campo da legislação ordinária, estão sempre numa posição de superioridade hierárquica, ou de superior eficácia, no confronto com as leis ordinárias (e eventualmente outros atos legislativos) da União, Estados-membros e Municípios (fls. 18). Pretende-se que a Lei Complementar, formalmente considerada (não a lei complementar no sentido material) ocupa uma posição intercalar ou intermediária entre a Constituição e as leis ordinárias. Em conseqüência, valem menos do que a Constituição e valem mais do que a lei ordinária. Neste trabalho contesta-se entretanto que, dessa ‘inserção sistemática’ da lei complementar, se deva concluir pela sua superioridade no confronto com a lei ordinária (fls. 21). Não se nega a procedência da afirmação de que a lei ordinária não pode revogar a lei complementar. Todavia, partindo dessa afirmação não é possível extrair a conclusão pela superioridade formal da lei complementar porque a recíproca é igualmente verdadeira: a lei complementar não pode revogar a lei ordinária. E não pode em virtude basicamente de dois argumentos; 1º) os campos da lei complementar e da lei ordinária em princípio não se interpenetram, numa decorrência da técnica constitucional de distribuição ratione materiae de competência legislativa; 2º) a superveniência da lei complementar somente suspende ou paralisa a eficácia da lei ordinária, em casos excepcionais e que serão oportunamente examinados (fls. 24 e 25). Se a lei complementar (a) invadir o âmbito material de validade da legislação ordinária da União, valerá tanto quanto uma lei ordinária federal. Sobre esse ponto não há discrepância doutrinária (fls. 26). Se ocorrerem as hipóteses de invasão, pela lei complementar, da esfera de competência legislativa dos Estados-membros e Municípios ou (d) de a lei ordinária dos Estados-membros e Municípios invadir o campo privativo da lei complementar, estaremos diante de atos inconstitucionais do Congresso ou das Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores, conforme a hipótese (fls. 27)".

    6. Muito do que ficou dito é elementar. Mas é importante recordar essas noções básicas, máxime quando se cuida de equiparações. Equiparação consiste, nada mais, nada menos, em fazer de conta que seja, aquilo que não é. No campo do Direito, a equiparação ou, em outras palavras, a "ficção legal", é recurso válido, mas somente surte efeitos para os fins previstos na norma que a instituiu e, evidentemente, respeitados os limites de abrangência dessa norma. Ficção é palavra de origem latina, que significa ato ou efeito de fingir, simulação, coisa imaginária, fantasia, invenção, criação, de modo que o uso do referido recurso por si só demonstra a diversidade das coisas, fatos ou atos equiparados.

    7. Como salientam os Professores Ruy Barbosa Nogueira e Paulo

    Roberto Cabral Nogueira, "as ficções jurídicas, ao contrário das presunções, não são conjecturas, mas sim verdades legais, criadas exclusivamente pela lei material" (in "Direito Tributário Aplicado", Forense / EDUSP, 1975, p. 187).

    8. Resumindo, a fictio juris é recurso legítimo. Todavia, cabe ressaltar serem seus efeitos circunscritos ao campo de abrangência da norma que a instituiu. Para saber-se do alcance da ficção jurídica, tem-se que atentar para o alcance da norma que a estabeleceu. Se a equiparação nasce na lei federal, ordinária, evidentemente terá seus efeitos restritos ao campo do IPI, não podendo interferir na competência constitucional outorgada aos Estados.

    9. A Carta de 1988, em seu artigo 155, inciso I, alínea "b", atribui aos Estados e Distrito Federal a competência para instituir imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e, no inciso XI de seu § 2º, expressa que ele " não compreenderá, em sua base de cálculo, o montante do imposto sobre produtos industrializados, quando a operação, realizada entre contribuintes e relativa a produto destinado à industrialização ou à comercialização, configure fato gerador dos dois impostos ".

    10. A competência da União para instituir o imposto sobre produtos industrializados está agora prevista no artigo 153, inciso IV, da mesma Carta Constitucional a qual, em seu artigo 146, inciso III, alínea "a", explicita que "cabe à lei complementar a definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, base de cálculo e contribuintes" (grifos acrescentados). No caso, a lei complementar, recepcionada pela nova ordem constitucional, é o Código Tributário Nacional, o qual, na parte que interessa à situação em exame, assim soa:

    CTN, Artigo 46 - O imposto, de competência da União, sobre produtos industrializados tem como fato gerador:

    I - o seu desembaraço aduaneiro, quando de procedência estrangeira;

    II - a sua saída dos estabelecimentos a que se refere o parágrafo único do artigo 51;

    III - a sua arrematação, quando apreendido ou abandonado e levado a leilão.

    ................................................................................................................

    CTN, Artigo 51 - Contribuinte do imposto é:

    I - o importador ou quem a lei a ele equiparar;

    II - o industrial ou quem a lei a ele equiparar;

    III - o comerciante de produtos sujeitos ao imposto, que os forneça aos contribuintes definidos no inciso anterior;

    IV - o arrematante de produtos apreendidos ou abandonados, levados a leilão.

    Parágrafo único - Para os efeitos deste imposto, considera-se contribuinte autônomo qualquer estabelecimento de importador, industrial, comerciante ou arrematante (grifos acrescentados).

    11. Pelas normas da lei complementar vê-se que fato gerador do IPI é a saída de produto industrializado de qualquer estabelecimento de importador, de industrial, de comerciante de produtos sujeitos ao imposto que os forneça a industrial, e de arrematante de produtos apreendidos ou abandonados, levados a leilão. Quando ocorrerem esses fatos geradores do IPI e quando o produto industrializado a eles correspondente destinar-se à industrialização ou à comercialização, reza o texto constitucional que o montante do tributo federal não comporá a base de cálculo do tributo incidente sobre as operações relativas à circulação de mercadorias, ou seja, do ICMS.

    12. A lei complementar não faz outras equiparações; se o fizesse estaria na verdade definindo outros fatos geradores do tributo federal e valeria o que ficou dito acima, quanto à não inclusão de seu montante na base de cálculo do imposto estadual. A lei complementar delega competência para que a lei federal faça equiparações. Se valerem essas equiparações, frente à nova ordem constitucional, valerão elas apenas no âmbito da lei federal. A lei complementar é lei nacional, sujeitando às suas normas todos os entes tributantes que coexistem na República Federativa do Brasil. A lei federal (ordinária) sujeita tão-só a União.

    13. Entretanto, o exame da legislação federal requer atenção. Requer atenção porque por vezes seu legislador, despreocupado quanto às conseqüências que poderiam advir de interpretações equivocadas, coloca no mesmo balaio equiparações que faz e equiparações que já foram feitas. Exemplo dessa despreocupação nos dá o artigo 4º da Lei Federal nº 4.502/64, que diz serem equiparados a industrial, entre outros, os mesmos estabelecimentos já levados a essa condição pela lei nacional, isto é, por meio do já citado parágrafo único do artigo 51 do CTN.

    14. Pelo exposto, percebe-se que a disposição contida no item 4 do § 1º do artigo 24 da Lei paulista nº 6.374/89, a respeito de se incluir na base de cálculo do ICMS "o montante do Imposto sobre Produtos Industrializados na operação realizada por estabelecimentos simplesmente equiparados a industrial pela legislação relativa ao imposto federal", não merece censura, devendo-se todavia ter em mente, ao interpretá-la, que o termo "legislação" por ela empregado refere-se à legislação ordinária federal e não, evidentemente, à inserida no CTN, que tem foro de lei nacional.

    B - DO EXAME DO CASO EM CONCRETO

    15. No caso destes autos, as saídas objeto da reclamação tributária (que restam para apreciação: item 1 do AIIM; consta ter havido o recolhimento quanto aos demais itens) foram realizadas por estabelecimento importador. Essas saídas estão relacionadas e quanto a elas o Autuante esclarece que são "esferográficas, canetastinteiro, estojos para canetas, cachimbos, tabacos, etc.", e que se trata de "operações de distribuição de produtos importados do exterior para seus clientes varejistas". Em face do esclarecido, as saídas questionadas foram realizadas por contribuinte do IPI e destinam-se a comercialização por outro contribuinte, situação que se subsume no tipificado na Lei Maior, não sendo assim de se incluir o montante do IPI incidente na base de cálculo do ICMS.

    16. Cabe apontar dois equívocos no entendimento expresso pelo Autuante, nas manifestações que constam dos autos. Não lhe assiste razão quando diz que o autuado é contribuinte do IPI quando da importação, mas não na operação subseqüente, em que estaria apenas na condição de "simplesmente equiparado a industrial", pois a saída de estabelecimento do importador é fato gerador desse tributo federal por disposição de lei complementar (CTN, artigos 46, inciso II e 51, parágrafo único). Não lhe assiste razão outrossim, quando afirma que o montante do IPI não integra a base de cálculo do ICMS só no caso em que o adquirente das mercadorias venha a ostentar, na operação subseqüente, a condição de contribuinte do IPI; isto, além de configurar situação de incerteza no momento da realização do fato gerador, transgredindo a regra que norteia as ocorrências do gênero, não se conforma à letra do artigo 155, § 2º, inciso XI, da Constituição Federal de 1988, que em texto que pertine tanto ao IPI como ao ICMS refere-se a "contribuintes", sem determiná-los; assim, a operação realizada "entre contribuintes" se perfaz também quando o vendedor é contribuinte do IPI e do ICMS e o adquirente somente o é do tributo estadual.

    17. Em sendo assim, meu voto é para negar provimento ao apelo fazendário, divergindo do ilustre Relator apenas quanto à conclusão de seu brilhante voto.

    Plenário Antonio Pinto da Silva, em 19 de outubro de 1995.

    a) Raphael Moraes Latorre - Juiz com Voto em Separado.

    VOTO EM SEPARADO

    1. O importador é equiparado a industrial, conforme o artigo 9º do RIPI, Decreto nº 87.981/82, com amparo no artigo 4º, Inciso I, da Lei Federal nº 4.502/64.

    2. A base de cálculo do ICMS, na entrada da mercadoria importada, inclui a parcela do IPI (artigo 24, inciso IV, da Lei nº 6.374/89) e na saída, também há a mesma inclusão, por força do item 4, § 1º, artigo 24 da Lei nº 6.374/89.

    3. A clareza da norma estadual é tal que a autuada alegou a inconstitucionalidade do item 4, acima referido, sendo a alegação acolhida pela decisão revisanda.

    4. Com a devida vênia, juntando cópia do venerando acórdão do E. Tribunal de Justiça na Apelação Cível nº 16.265-2/0-01 da Comarca de São Paulo e salientando que, segundo consta, a Fazenda Estadual recorreu ao E. Supremo Tribunal Federal, e reportando-me às razões alinhadas no Processo DRT-3-1352/91, conheço do recurso interposto pelo Dr. Representante Fiscal e lhe dou provimento para restabelecer a decisão de 1a instância, conforme o voto do ilustre juiz Relator e da ilustre Dra. Eliana Maria Barbieri Bertachini.

    Plenário Antonio Pinto da Silva, em 24 de outubro de 1995.

    a) Álvaro Reis Laranjeira, Juiz com Voto em Separado.

    Resumo da Decisão: Pedido de Revisão da Fazenda. Negado provimento. Decisão não unânime. Proc. DRT-1 nº 19946/91, julgado em sessão de C.C.R.R. de 24/10/95.



    Comandos auxiliares:

  • Voltar à página anterior: "clicar" a tecla Back no topo da tela.
  • Voltar ao Índice Principal
  • Solicitar ajuda

    Elaboração:
    Luiz Antonio Castelo Branco (AFR - Assistente Fiscal da DIPLAT)
    José Antonio Moraes Salles (AFR - Assistente Fiscal da CT)
    Renato Scoleso (AFR - Consultor Tributário)


    Colaboração:

  • AFRESP - INTERNET - http:www.afresp.com.br
    Av Brigadeiro Luiz Antonio, 4.843 - São Paulo - SP - CEP 01401-002
    Tel.: 886-8800
  • Assistência da Legislação Tributária - ALT, órgão da Consultoria Tributária - CT
    Av. Rangel Pestana, 300 - 11 andar - 233-3469 - CEP 01091-900 - São Paulo - SP

    A reprodução deste trabalho poderá ser efetuada mediante prévia e expressa autorização da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo ou AFRESP












    CÂMARAS JULGADORAS
    DECISÃO NA ÍNTEGRA


    CRÉDITOS INDEVIDOS

    Boletim TIT Nº 311-A/97, de 09/07/95 - DOE 6-12-97

    - CRÉDITOS INDEVIDOS
    - SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA
    - CRÉDITO EXTEMPORÂNEO
    - NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO - DECISÃO UNÂNIME.

    RELATÓRIO

    Trata-se de Recurso Ordinário, objetivando desconstituir a decisão que julgou procedente o AIIM, lavrado por ter a recorrente se creditado do ICMS de "valor recolhido indevidamente em decorrência do regime de substituição tributária, referente a diferença de alíquotas de veículos" (1.1), bem como, por crédito efetivado com base no denominado "Crédito Extemporâneo", comportamentos esses não previstos na legislação que rege a matéria.

    O ICMS é exigido com base nos arts. 58, 84, 97 e 214 do Decreto 33.118/91, e a multa com fundamento no art. 592, II, "h" c/c §§ 1º, 9º e 10º.

    Em seu recurso a recorrente alega, preliminarmente, a inconstitucionalidade da Lei nº 7.646/91 que dispõe sobre a elevação da alíquota de 17% para 18% e, especialmente, porque afronta a Lei Federal nº 4.320/64, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração dos orçamentos e balanços da União, Estados, Municípios e Distrito Federal.

    Para sustentar o seu ponto de vista de que a alíquota do ICMS foi majorada de forma a caracterizar a sua ilegitimidade, em confronto com as Leis nºs. 6.556/89, 7.003/90 e 7.646/91, e, consequentemente a sua ilegalidade ao ser analisada sob o ponto de vista de Texto Maior, passa a recorrente a discorrer sobre os aspectos de natureza jurídica que, em seu entender, embasa a tese de inconstitucionalidade argüida procurando justificar o argumento de que "por não estarem previstos na Lei de Orçamento para 1992, tais recursos não podem, também, ter o destino previsto na Lei sob pena de ofensa ao inciso I do art. 167, que proíbe o início de programa ou projeto não incluído na lei orçamentária anual".

    Prossegue a recorrente por transcrever dispositivos da Lei 7.646/91 para, em confronto com a Lei 4.320/64 e art. 167 da CF/88 concluir pela falta de previsão orçamentária que lastrearia a elevação da alíquota do ICMS para o período objeto da presente controvérsia. Em abono da sua tese, cita, ainda, entendimento do Poder Judiciário no Processo 537/92 que tramita na 10ª Vara da Fazenda Pública.

    Relativamente ao valor recolhido em decorrência do regime de substituição tributária, a recorrente opta por tecer considerações em torno do Convênio 66/88, cita lição dos Juristas Alcides Jorge da Costa e Paulo de Barros Carvalho para demonstrar a inaplicabilidade do Convênio 107/89 que seria inaplicável à revenda de veículos, conforme reconheceu o Juiz da 3a Vara da Fazenda Pública de São Paulo no Processo 730/90.

    Em sua linha de raciocínio, a recorrente passa a discorrer sobre os Princípios da Capacidade Contributiva, da Tipicidade Tributária, da Legalidade Tributária e da Não-Cumulatividade para, com fulcro nos ensinamentos de Geraldo Ataliba, Aires F. Barreto e Alberto Xavier, concluir pela legalidade dos atos praticados, o que inviabilizaria a pretensão fiscal contida no AIIM em discussão.

    O Sr. AFR presta informações onde salienta que "as razões da recorrente, em sua essência, assentam-se em matéria estranha à competência deste Tribunal".

    A douta Representação Fiscal opina pelo desprovimento do recurso.

    Tendo a recorrente protestado por sustentação oral, aguardo o seu pronunciamento, após o que formularei a minha decisão. É o relatório.

    VOTO

    Tendo a recorrente comparecido para proceder à sustentação oral requerida, ocasião em que optou pela apresentação de MEMORIAL, passo a decidir.

    Inicialmente, entendo ser fundamental colocar em relevo a exata delimitação da controvérsia, tendo em vista que, desde a apresentação da DEFESA, a discussão teve por fulcro duas teses: a de que a majoração da alíquota de 17% para 18% introduzida pela Lei 6.556/89 é ilegal e a de que o recolhimento antecipado do ICMS, via montadora, por substituição tributária e por força do Convênio ICM-nº 107/89, atenta contra o Texto Constitucional.

    Admitindo as referidas teses, procurou o Fisco enfrentar as alegações da recorrente, apresentando, para tanto, argumentos destituídos de qualquer nexo com a pretensão formulada no AIIM em debate, quais sejam, o de que o aumento da alíquota se justificava porque se pautava na Lei 6.556/89 "e suas alterações que prorrogaram sua validade" e porque "os órgãos administrativos em geral... não podem negar a aplicação a uma lei ou a um decreto, porque lhes pareça inconstitucional". (excerto de ementa transcrita às fls.). Afirmação essa destituída de conteúdo jurídico e que foi repudiada por este E. Tribunal na "Questão de Ordem" - SF. 2713/95.

    O i. julgador do DRT/5-G, no entanto, embora cometesse o mesmo lapso ao reproduzir a citada afirmação, recorre a argumentos de natureza constitucional para fundamentar o seu entendimento, procedimento esse absolutamente correto, e recoloca a questão em seu devido lugar, ao analisar o comportamento da recorrente que se creditou do ICMS "em desacordo aos preceitos legais, pertinentes à matéria, acarretando falta de recolhimento do imposto nos meses em que ocorreram os lançamentos indevidos", raciocínio esse fulcrado no item 4 da Resposta formulada à Consultoria Tributária (Consulta 910/92).

    Nesse contexto, delimito o campo da controvérsia do "Relato da Infração" do AIIM, que imputa à recorrente o fato de ter se creditado indevidamente do ICMS "referente a diferença de alíquota", bem como, de valores objeto de operações sujeitas ao "regime de substituição tributária", sob a forma denominada de "Crédito Extemporâneo".

    Consequentemente, a discussão dever ser equacionada, no sentido de se indagar sobre a legitimidade do comportamento da recorrente que se creditou do ICMS recolhido por terceiro e pago pelo consumidor final, independentemente de se questionar se o tributo decorrente dessas operações tem ou não, como suporte, mecanismo de incidência tido como infringente de dispositivo de natureza constitucional.

    Assim, colocada a controvérsia em seus devidos termos, entendo que razão assiste ao Fisco ao lavrar o AIIM.

    É que, ao efetuar os créditos do imposto, as operações de aquisição e venda dos veículos já estavam completas, tanto que, a própria recorrente as denominou de "Créditos Extemporâneos", ou seja, advindos de transações consumadas e, portanto aptas a refletir os seus efeitos.

    Por via de consequência, o comportamento da recorrente se traduziu no ato de se apoderar de créditos do ICMS, perfeitamente delineados, e que já estavam em poder do sujeito ativo, recolhidos que foram, pelo fabricante do veículo. De se notar, ainda, que a recorrente ao se creditar do imposto, menciona como base de cálculo, as operações de vendas que deram origem ao seu faturamento mensal (cópias de GIAS e Registro de Apuração do ICMS), o que significaria dizer que o ciclo "montadora-distribuidora-consumidor final" já houvera se consumado, o que, "de per se" e apenas para argumentar, inviabiliza toda a tese construída, aliás, com muita competência, no sentido de que os créditos escriturados "aparentemente ilegítimos, apenas traduzem o "modus" de ressarcimento que lhe sobrou" face ao que denomina de antecipação do tributo "antes da ocorrência do fato gerador e sobre base de cálculo ficta"

    Portanto, concordo com a afirmação contida na r. decisão de que o crédito procedido pela recorrente acarretou "falta de recolhimento do imposto nos meses em que ocorreram os lançamentos indevidos".

    Para sedimentar esse raciocínio repito que o crédito, decorrente de operações inteiramente acabadas, já se encontrava em poder do sujeito ativo da relação jurídica tributária tornando impossível ao sujeito passivo simplesmente estornar da conta do credor, quantia recolhida a título de tributo devido em razão de transações praticadas pelas três partes envolvidas no negócio.

    Finalmente, chamo a atenção para o fato de que, a se admitir como legítimo o comportamento da recorrente, seria colocada em risco toda a relação Fisco/Contribuinte, porque toda vez que este se sentisse prejudicado, bastaria simples lançamento contábil para reverter situação tida como ilegítima ou ilegal, à revelia dos instrumentos jurídicos que disciplinam tais situações.

    Isto posto e por mais que dos autos consta, nego provimento ao recurso interposto para confirmar em todos os seus termos a decisão recorrida.

    Sala de Sessões, 16 de novembro de 1995.

    a) Djalma Bittar, Relator

     

    RESUMO DA DECISÃO: Recurso Ordinário. Negado provimento. Decisão unânime. Proc. DRT-5 nº 6380/93, julgado em sessão da 4 a Câmara, de 16.11.95
    - Rel. Djalma Bittar.