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AFISCOM

CÂMARAS JULGADORAS
DECISÃO NA ÍNTEGRA


BOLETIM TIT Nº 302/97 de 24-05-97

(DOE de 24-5-97)

IMPORTAÇÃO

PESSOA FÍSICA - IMPORTAÇÃO DE BENS PARA USO PRÓPRIO - OPERAÇÃO REGULADA PELO DECRETO - LEI Nº 406/68 - O PARTICULAR NÃO SE ENQUADRA COMO CONTRIBUINTE DO ICMS - PROVIDO O RECURSO - DECISÃO NÃO UNÂNIME.
RELATÓRIO

1. O contribuinte, pessoa física, está sendo acusado de falta de pagamento do imposto relativo à importação de um veículo marca Ford Explorer, um jet-esqui Yamaha e um reboque Continental para jet-esqui, recolhimento que deveria ter sido feito mediante GR Especial.
2. A apreensão dos bens ocorreu em trânsito, no km 54 da Via Anchieta. O transporte estava sendo efetuado por companhia transportadora e, na oportunidade, os bens estavam acobertados por CTRC, GR IPI e II e DI registrada na DRF de Paranaguá, PR.
3. Inconformado com a decisão desfavorável de 1a instância, o contribuinte vem dela recorrer, mediante recurso ordinário, aduzindo, em síntese:
3.1 - que o recorrente promoveu a importação dos bens objeto da autuação para o seu uso pessoal;
3.2 - que importou ao abrigo de guia de importação;
3.3 - que, por ter domicílio também em Curitiba, Paraná, promoveu o ingresso dos bens pelo Porto de Paranaguá, "... de custos, pública e notoriamente inferiores aos do porto de Santos...";
3.4 - que os bens foram desembaraçados em Paranaguá, Paraná;
3.5 - que os bens foram remetidos ao Estado de São Paulo para serem revisados, antes que o recursante os recebesse;
3.6 - que o AIIM e a decisão recorrida ofendem a Constituição Federal e a Lei Complementar que rege o ICMS (Decreto-lei 406/68);
3.7 - que os bens importados não se constituem em mercadorias, não se destinam a qualquer estabelecimento e nem foram importados por titular de estabelecimento;
3.8 - que os bens foram adquiridos nos EstadosUnidos da América do Norte pelo recorrente e a transmissão da propriedade operou-se fora da jurisdição brasileira;
3.9 - que, nesse contexto, inocorreu o fato gerador;
3.10 - que, tanto os dispositivos da Lei nº 6.374/89, quanto os dispositivos regulamentares que conflitam com a Constituição Federal, não têm valor jurídico e não podem servir de fundamento para a autuação;
3.11 - que, ainda que se admitisse a validade de tais normas, "faleceria à Fazenda do Estado de São Paulo competência para exigir o ICMS e multa porventura devidos (...), visto que (a importação) ocorreu fora da área de sua jurisdição e tem o recorrente domicílio também no Estado do Paraná, por onde se processou o desembaraço aduaneiro dos bens".
3.12 - que, ante o exposto, pede a reforma da decisão de 1º grau e a improcedência do AIIM lavrado.
4. Em tendo o Fisco apresentado suas contra- razões, uma vez que o recursante, nos termos da lei, protestou pela sustentação oral de suas razões, aguardo a sua produção para, ao depois proferir o meu voto.

VOTO

5. Talvez, o argumento principal do recorrente seja o relativo à sua condição de pessoa física, que não importe mercadorias. Entretanto, a importação de bens do exterior por pessoas naturais é hipótese contemplada na lei e no regulamento do ICMS como passível de pagamento do imposto, aliás, como bem o assinala o AIIM exordial ao consignar os dispositivos infringidos. Mediante o seu confronto, verifica-se que em importações da espécie:
a)são alcançados bens e mercadorias, bem como pessoas naturais ou jurídicas;
b) não se exige o requisito da habitualidade para a caracterização da sujeição passiva;
c) para efeito de cobrança do imposto, o local da operação, na hipótese de falta do local do estabelecimento destinatário, é o do domicílio do adquirente (no caso, São Paulo, já que o recorrente não comprovou seu domicílio no Paraná, local do desembaraço);
d) o pagamento é feito mediante Guia de Recolhimentos Especiais, até o momento do registro da DI, ou no recebimento da mercadoria ou bem.
6. Argumenta, ainda, o contribuinte, suscitando inconstitucionalidade da legislação "lato sensu" paulista, assentada no Convênio ICM 66/88. "Data venia", referido convênio hauriu sua força no próprio texto constitucional. Com efeito, a esse respeito, é bastante elucidativo o artigo 34 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, ao dispor, em seus parágrafos 3º, 4º, 5º e 8º:
§ 3º - Promulgada a Constituição, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão editar as leis necessárias à aplicação do sistema tributário nacional nela previsto;
§ 4º - As leis editadas nos termos do parágrafo anterior produzirão efeitos a partir da entrada em vigor do sistema tributário nacional nela previsto;
§ 5º - Vigente o novo sistema tributário nacional, fica assegurada a aplicação da legislação anterior, no que não seja incompatível com ele e com a legislação referida nos §§ 3º e 4º ;
§ 8º - Se, no prazo de sessenta dias contados da promulgação da Constituição, não for editada a lei complementar necessária à instituição do imposto de que trata o art. 155, I, "b" os Estados e o Distrito Federal, mediante convênio celebrado nos termos da Lei Complementar nº 24, de 7 de janeiro de 1975, fixarão normas para regular provisoriamente a matéria.
7. "Data venia", em sua argumentação, incide o recursante em um equívoco lógico: aduz que, em tendo sido o Decreto-lei nº 406 recepcionado pela atual Lei Maior, por força do § 5º do artigo 34 acima referido, as disposições da novel legislação do tributo a ele deveriam adequar-se. Nada mais inverídico, não só porque mencionado Decreto, em sendo de 1968, é anterior ao atual sistema tributário - que criou um tributo estadual - permitam-me dizê-lo assim - mais "gordo" (o ICMS) e, por assim ser, não contido naquela norma em toda a sua inteireza - mas pela própria diretriz inversa, expressa no próprio § 5º citado, "in fine": "... fica assegurada a aplicação da legislação anterior, no que não seja incompatível com ele e com a legislação referida nos §§ 3º e 4º ". Assim, à toda evidência, parece-me claro que, em caso de incompatibilidade entre o Decreto-lei nº 406/68 e a nova legislação do ICMS, prevalece esta, em detrimento daquela.
8.Um último ponto merece, ainda, abordagem: teria a legislação infraconstitucional exorbitado ao fazer incidir sobre BENS o tributo, que seria, em última análise, sobre circulação de MERCADORIAS ? Não obstante a reconhecida polemicidade do tema, entendo que não. A propósito, convém lembrar aqui que o próprio texto constitucional utiliza-se dos dois termos - v.g. o inciso VII do parágrafo 2º do artigo 155, que ora transcrevo: "em relação às operações e prestações que destinem BENS e serviços a consumidor final localizado em outro Estado...".
9.Assim, ante o exposto, considerando a lei posta, nego provimento ao recurso para manter a decisão recorrida e, em conseqüência, o AIIM exordial.
Sala das Sessões, em 24 de novembro de 1994.
a) Luiz Carlos Picinini, Relator

VOTO DE VISTA

1. Pedi vista destes autos, após o voto do Ilustre Juiz Relator, Doutor Luiz Carlos Picinini, a fim de manifestar - me em separado, a respeito de tão relevante matéria. Neste sentido, trouxe ao conhecimento dos Ilustres Pares, algumas observações, com apoio na jurisprudência do Poder Judiciário e da melhor doutrina, para embasar os fundamentos que nortearam o voto por mim proferido.
2. Trata-se de recurso ordinário, objetivando a reforma da decisão de Primeira Instância, que manteve a exigência do AIIM, impondo ao ora recorrente, obrigação de pagamento do ICMS relativo à importação que efetuou - na qualidade de simples particular - de um veículo ( automóvel ), para uso próprio.
3.Como sustentou o recorrente, as apontadas disposições da lei paulista não encontram apoio sequer nas denominadas "Normas Provisórias do ICMS", aprovadas pelo Convênio ICM nº 66, de 14 de dezembro de 1988.
4. A Constituição de 1988 manteve no que concerne à importação de mercadorias e bens - o sistema anterior resultante da Emenda nº 23/83, donde se conclui que o particular continua excluído do imposto estadual, pois não realiza operações relativas à circulação de mercadorias nem presta os serviços antes tributados pela União e que agora passaram à competência impositiva dos Estados (serviços de comunicação e transporte não municipal).
5. Além disso, tal como a Emenda nº 23/83, o art. 155, § 2o, IX, "a", continua a fazer referência à entrada no estabelecimento do importador como requisito do fato gerador do ICMS. Assim, não pode a tributação estadual atingir a importação de bem estrangeiro, realizada por simples particular, mesmo porque não se configura em tal hipótese o requisito constitucional da entrada da mercadoria no estabelecimento.
6. Como visto, estão em controvérsia várias disposições constitucionais, dentre as quais se destacam as constantes do art. 155, inciso I, "b", (que atribui competência aos Estados para instituição de imposto sobre "operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior") e § 2º, inciso IX, "a", ( que diz incidir também o referido imposto "sobre a entrada de mercadoria importada do exterior, ainda quando se tratar de bem destinado a consumo ou ativo fixo do estabelecimento, assim como sobre serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o estabelecimento destinatário da mercadoria ou doserviço").
7. Abstraído o fato de que as "Normas Provisórias do aludido Convênio ICM 66/88 não oferecem amparo à lei paulista, a verdade é que a interpretação dada pela Fazenda Estadual contraria não só o espírito, mas a própria letra do art. 155, I, "b" e o parágrafo 2º, IX, "a", da Constituição Federal.
8. Na lição de AMÍLCAR DE ARAÚJO FALCÃO, antes da reforma tributária de 1965, a noção de fato gerador constitui dado fundamental para a distinção dos tributos in genere (imposto, taxa, contribuição de melhoria), quanto in specie (cada espécie de imposto), salientando aquele insigne tributarista que a circunstância é decisiva, em direito positivo brasileiro, para o funcionamento do sistema constitucional de discriminação de rendas (AMÍLCAR DE ARAÚJO FALCÃO, " Fato Gerador da Obrigação Tributária", 1a ed., Financeiras, Rio, 64, p. 152 à 153).
9. Essa condição doutrinária, que foi consagrada no art. 4º do Código Tributário Nacional (CTN), é hoje agasalhada no próprio Texto Constitucional que, ao dispor no art. 154, I, sobre a competência residual da União, veda a instituição de impostos que tenham "fato gerador ou base de cálculo próprios dos discriminados nesta Constituição. Disso decorre que a simples menção do fato gerador - como já assinalara AMÍLCAR DE ARAÚJO FALCÃO - leva à identificação do contribuinte, pela natural e necessária atribuição desse fato a certo sujeito.
9.1 - Em suma: ao mencionar a Constituição o fato gerador de um imposto, está ela, ao mesmo tempo, identificando o respectivo contribuinte. Assim, à lei complementar (art. 146, III, "a", explicitado quanto ao ICMS no art. 155, § 2º , XII, "a") a Constituição atual - como já o fazia a Constituição de 1969 - reserva a tarefa de apenas revelar, declarar quais são os contribuintes dos "impostos discriminados não a de criar uma categoria de contribuinte que já esteja compreendida no Texto Constitucional.
10. Ora, segundo a própria letra do artigo 155, I, "b", da CF/88, só pode ser contribuinte do ICMS quem pratica "OPERAÇÕES RELATIVAS À CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS" ou efetua "prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação". Não, por conseguinte, o simples particular. Daí a observação de ROQUE CARRAZZA, endossada por PAULO DE BARROS CARVALHO:
" O art. 155, XII, "a" , estipula: Cabe à lei complementar definir os seus contribuintes. Será que essa lei complementar tem inteira liberdade para indicar os sujeitos passivos possíveis? Com o ICMS, como vulgarmente está sendo chamado, pessoalmente entendo que não. Acho que só poderão figurar no polo negativo da obrigação de pagar o ICMS pessoas que, de algum modo, estejam relacionadas, comprometidas com a operação mercantil, no caso do ICM, e com a prestação de serviços de transporte e telecomunicações. Portanto, com ou sem lei complementar, atrevo-me a dizer que o particular jamais poderá ser compelido a pagar esse tributo.". (in RDT vol. 46, p. 159) g.n.
11. No mesmo sentido é o ensinamento de ALCIDES JORGE COSTA, que lembra, em apoio de sua assertiva, que a CONSTITUIÇÃO, ao tratar do ICMS, mais uma vez se refere a "estabelecimento" (art. 155, parágrafo 2º, inciso IX, "a", e XII, "d", art. 34, § 9º , das Disposições Transitórias). Assim, diz ALCIDES JORGE COSTA, se "a cobrança do tributo está ligada à noção de estabelecimento, parece claro que ele não pode ser exigido de particulares, ainda quanto, por ocasião da entrada no País, com mercadorias que tenham comprado no exterior" (in DRT. Vol. 46, p. 163) g.n.
12. Aliás, a noção de estabelecimento se vincula ao exercício habitual de uma atividade. Donde mais uma vez se conclui pela exclusão do particular da área de incidência do ICMS, constitucionalmente delimitada, por ausência do requisito da HABITUALIDADE na prática das atividades mencionadas no art. 155, I, "b".
13. De resto, o § 2º, IX, "a", do artigo 155, continua a indicar a entrada do bem no estabelecimento do importador como elemento essencial à configuração do fato gerador do ICMS - como passara a fazer a Constituição anterior, na redação da Emenda nº 23/83 (art. 23, parágrafo 11). Mas a Constituição atual acrescenta, sabiamente, que o ICMS, no caso de importação, cabe "ao Estado onde estiver situado o estabelecimento destinatário da mercadoria ou serviço"(g.n.). Trata-se de um aperfeiçoamento de redação do dispositivo constitucional anterior para evidenciar que a competência para cobrar o ICMS pertence não ao Estado onde eventualmente for desembaraçada ou desembarcada a mercadoria importada, mas sim ao Estado "onde estiver situado o estabelecimento destinatário" (g.n.). Verifica-se, assim, que - além de continuar a referir o aspecto temporal do fato gerador (entrada no estabelecimento, já que o texto não permite que se cogite de outro tipo de "entrada da mercadoria") - a Constituição atual vai buscar no estabelecimento destinatário o elemento definidor da competência tributária.
14. Permanece válida, portanto, frente à Constituição de 1988, a orientação da Suprema Corte, cristalizada na SÚMULA 577:
"577 - Na importação de mercadoria do exterior, o fato gerador do imposto de circulação de mercadorias ocorre no momento de sua entrada no estabelecimento do importador."
14.1 - Dessa orientação jurisprudencial também decorre a conclusão, já alcançada anteriormente de que o ICMS sobre a entrada de produto importado não pode ser exigido de particulares.
15. Não se argumente que a norma do artigo 1º, II, do Decreto-lei 406/88, deve ser tida como revogada pelo Convênio ICM nº 66/88, que tem força de lei complementar. Daí a possibilidade de a lei estadual erigir o simples particular como contribuinte, ante a maior abrangência permitida à lei complementar pelas normas constitucionais relativas ao ICMS ( ponto já refutado anteriormente).
15.1 - Ora, segundo o disposto nos artigos 44 e 48, I, da Constituição, "O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional", cabendo-lhe "dispor sobre todas as matérias de competência da União", entre as quais "sistema tributário, arrecadação e distribuição de rendas". Além disso, a lei complementar, nos termos do art. 69, da CF/88, será aprovada "por maioria absoluta".
15.2 - Ante essas disposições constitucionais de clareza meridiana - fundadas nos princípios da separação de poderes e da federação -, é impossível admitir que a Constituição, contrariando aqueles princípios, tenha relegado a representantes do Poder Executivo das unidades da Federação com a participação de representantes do Governo Federal (CONFAZ), a simples ratificação pelo Poder Executivo de todas as unidades, o poder de elaborar normas gerais de direito tributário sobre ICMS, próprias de lei complementar. Menos ainda que tais normas (que, ademais, são "provisórias") tenham a virtude de revogar disposições do Decreto-lei nº 406/68.
15.3 - Note-se que a Constituição Federal é tão exigente quanto às matérias reservadas à lei complementar, que sequer admite sejam tais matérias objeto de lei delegada (art. 68, § 1º).
15.4 - Na verdade, como anota ALCIDES JORGE COSTA, a propósito do § 8º, do artigo 34, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias:
"É claro que esta delegação não pode ser entendida do modo pelo qual os Estados o fizeram, pela simples razão de que não se pode dar-lhe uma amplitude que contraria a própria constituição. Trata-se, apenas, e não mais do que isso, de uma delegação, de poderes normalmente exercidos por suas Assembléias Legislativas... (...) E o que o parágrafo 8º do art. 34 fez foi delegar aos poderes executivos dos Estados poder para, em conjunto e segundo os procedimentos estabelecidos na lei complementar 24/75, exercerem a competência legislativa que o art. 24 da Constituição dá aos Estados, ou seja para legislarem sobre normas gerais de direito tributário, se inexistente lei federal a respeito. (ALCIDES JORGE COSTA, ICM - Tributação dos Produtos Semi- Elaborados, em RDT 47, p. 65/66).
15.5 - Assim, o § 8º do art. 34, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, não tem a amplitude que lhe empresta a Fazenda Estadual. Apenas objetivou evitar ficassem os Estados impedidos, por omissão do Congresso Nacional, de instituir o ICMS. Por isso, se refere à não edição da "Lei Complementar necessária à instituição do imposto" e permite aos Estados, mediante convênio, a fixação de "normas para regular provisoriamente a matéria. Isto é, para dispor sobre aqueles pontos "necessários à instituição do imposto" e não contemplados nas normas gerais de direito tributário existentes.
16. Em outras palavras: a autorização constitucional não se estende à revogação das normas gerais atinentes ao ICM (Decreto - lei 406/68). Por serem compatíveis com o novo sistema tributário, continuam a vigorar as normas gerais estabelecidas pelo citado Decreto - lei nº 406/68.
17. Aliás, o § 5º do mesmo artigo 34 assegura expressamente "a aplicação da legislação anterior, no que não seja incompatível com ele" (como o novo sistema tributário nacional).
17.1 - Nessas condições, diz ALCIDEZ JORGE COSTA, "se o ICM existia na Constituição anterior tal como existe na de 1988; se havia um corpo de normas gerais atinentes ao ICM; se estas normas não são incompatíveis com a nova Constituição, segue-se que elas foram recebidas pela nova ordem constitucional e, portanto, continuam em vigor. (RDT 47, p. 65)
18. Portanto, ainda que se admita, exclusivamente para argumentar, que a Constituição de 1988 tenha alargado o campo de incidência do antigo ICM, até mesmo ao ponto de permitir seja o simples particular definido como contribuinte pela lei complementar, não o poderia fazer a lei paulista, porque continuam em vigor as normas do Decreto - lei 406/88, especialmente o disposto em seu art. 1º, II.
19. A Lei Estadual nº 6.374/89, na parte em que definiu como contribuinte o simples particular e dispensando, até mesmo, o requisito da habitualidade na prática de operações relativas à circulação de mercadorias, para assim definir o contribuinte do ICMS, fere dispositivo da lei federal (Lei Complementar - Dec. - lei 406/88) e a própria Constituição Federal.
20. O Decreto-lei nº 406/88, dispõe, no artigo 6º, e parágrafos, que:
"Contribuinte do Imposto é o comerciante, industrial ou produtor que promove a saída de mercadoria, ou o que arremata em leilão ou adquire em concorrência promovida pelo poder Público, mercadoria importada e apreendida".
20.1 - E o § 1º, do referido artigo 6º do Decreto-lei nº 406/88, prevê, expressamente, que a equiparação a contribuinte somente pode ocorrer com aqueles que pratiquem com "habitualidade" operações relativas à circulação de mercadorias.
20.2 - A Lei estadual já referida, inusitadamente, contrariando a Lei Complementar vigente, e a própria Constituição Federal, insere o simples particular como contribuinte do ICMS, quando importe bem do exterior, para uso próprio, ainda que não tenha estabelecimento e, mais ainda, dispensando, para o caso, o requisito da habitualidade.
21. A Lei estadual nº 6.374/89 foi além de sua competência; foi além do Convênio ICM 66/88, porque a autorização das Disposições Constitucionais Provisórias não teve o alcance pretendido, ante a inexistência de lacuna legal. A matéria é regrada pelo Decreto - lei Federal 406/68, de natureza complementar, plenamente válido e eficaz, recepcionado que foi pela nova ordem constitucional.
22. No v. acórdão do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso especial nº 7.582, RJ, publicado no DJU de 27.05.91, sendo relator o Ministro Américo Luz, discutiu-se a propósito do alcance do art. 34, parágrafo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Provisórias se, consequentemente, do Convênio ICM 66/88 e da Lei Estadual nele baseada.
22.1 - Neste v. acórdão ficou expresso que:
"Ao art. 34, parágrafo 8º , do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, não deu a amplitude com que se houve o acórdão recorrido... Ora, a citada Lei Complementar só autorizou os Estados a celebrarem convênios para isenção, anistia, remissão, transação, moratória, parcelamento de débitos fiscais e ampliação do prazo de recolhimento do ICM. É certo, porém, que na ausência de Leis Complementares, as normas gerais serão supridas pelos Estados. Entretanto, tenho que ficou assegurada a aplicação da legislação anterior (CFADTC art. 34, parágrafo 5º), desde que não incompatível com a legislação nova."
Concluindo, com apoio na doutrina de Alcides Jorge Costa e Ives Gandra da Silva Martins, citados no v. acórdão: "DESSE MODO, O ICM DE MERCADORIA IMPORTADA CONTINUA REGULADO PELO DECRETO - LEI Nº 406/68, PORQUANTO RECEPCIONADO PELO NOVO TEXTO CONSTITUCIONAL, UMA VEZ DESPIDO DA EIVA DE INCOMPATIBILIDADE."
23. Diante destas considerações, que ouso trazer ao elevado exame e julgamento dos meus ilustres pares, meu voto é divergente do Senhor Juiz Relator. Entendo que o auto de infração inicial é insubsistente e, por isso, DOU PROVIMENTO integral ao recurso ordinário formulado, reformando a decisão de primeira instância.
É o meu voto.
Sala das Sessões, em 04 de dezembro de 1994.
a) José Augusto Sundfeld Silva, Juiz com Vista.

RESUMO DA DECISÃO: Recurso Ordinário - Provido - Decisão não unânime - PROC. DRT. 1- nº10648/92, julgado em sessão da 4a Câmara Especial de 04.12.94.












BOLETIM TIT Nº 303

(DOE de 7-6-97)

CÂMARAS REUNIDAS
DECISÃO NA ÍNTEGRA

SUPLEMENTO PARA RAÇÃO ANIMAL - PRODUTO IMPORTADO DE PAÍS SIGNATÁRIO DO GATT - ISENÇÃO CONCEDIDA A SIMILAR NACIONAL EXTENSIVA À MATÉRIA-PRIMA - PROVIDO O PEDIDO DE REVISÃO DO CONTRIBUINTE - DECISÃO NÃO UNÂNIME.

RELATÓRIO

1. Acusado de ter deixado de promover o recolhimento do ICMS nas entradas, em seu estabelecimento, das mercadorias em questão, o contribuinte viu mantida a acusação fazendária no julgado unânime da 3ª Câmara Especial, em sua anterior composição, Rel.Odair Guerreiro.
2. Fundamentos para a decisão da 3ª Câmara Especial foram que não se tratando de ração animal o suplemento não poderia gozar do benefício da isenção, e também que o contribuinte não teria provado atender aos requisitos para a fruição do favor fiscal, faltando a demonstração de seu registro e o do produto no Ministério da Agricultura.
3. Inconformando-se, o contribuinte interpôs pedido de revisão, sustentando que o julgado recorrido seria discrepante, em seus critérios jurídicos de decidir, daqueles assentados pela 2ª Câmara Especial no DRT - 1 nº 11094/89 (Rel. o ilustre Juiz Sérgio Mazzoni), e pela 1ª Câmara Efetiva, no DRT-1 nº 8605/91 (Rel. o ilustre Juiz Antonio Carlos Grimaldi), ambos no sentido de que tratando-se de suplementos importados de país signatário do GATT, utilizados na fabricação de rações balanceadas, era situação de isenção.
Quanto à dita falta de comprovação dos registros da empresa e do produto no Ministério da Agricultura, sublinhou que a fiscalização "...afirmou categoricamente tratar-se de suplemento, conclui-se, portanto, até por uma questão de lógica, que verificou pessoalmente os documentos relativos ao produto importado pela recorrente e que estes estavam em ordem, pois não fez nenhuma ressalva nesse sentido.
Não sendo, portanto, objeto de controvérsia a existência da citada documentação, a recorrente não teria porque trazê-la aos autos...".
4. A Representação Fiscal é pelo não conhecimento do apelo; caso abordado o mérito, pelo seu desprovimento.
5. Vistos, examinados e assim relatados, decido.
VOTO
6. Não resta dúvida de que o produto importado foi suplemento para ração animal, originário de país firmatário do GATT. Isto é incontroverso, vez que admitido nas manifestações fiscais e no próprio aresto recorrido.
7. Dessarte, tomo conhecimento do apelo, dado que o julgado revisando efetivamente assumiu critérios de direito distintos daqueles adotados nos acórdãos dados como paradigmas, ao marcar que os suplementos não poderiam gozar da isenção concedida às rações animais.
8. No mérito, provejo o recurso, por entender que o melhor direito está com o quanto decretado nas decisões ofertadas a confronto, na direção de que "...o termo ração balanceada compreende, igualmente, as rações, os suplementos e os concentrados, segundo os próprios termos da legislação federal que os define, registra e fiscaliza...".
9. De se observar que o entendimento dos Tribunais Superiores dá amparo à pretenção do contribuinte, como se vê na ementa da decisão da C. 1ª Turma do E. Superior Tribunal de Justiça, na apreciação do RE n.31.268-9-SP (93.0002041-2), Rel. o Min. Demócrito Reinaldo, na DJVVI 26.04.93, pag.7179):
"TRIBUTÁRIO.ICM.GATT. MATÉRIA-PRIMA. SIMILAR NACIONAL.ISENÇÃO.
A jurisprudência dominante no Supremo Tribunal Federal e neste Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a isenção concedida a similar nacional de mercadoria importada de país signatário do GATT é extensiva à matéria-prima utilizada para compor mercadoria idêntica ao produto acabado nacional. Recurso provido, por unanimidade".
10. Com esses fundamentos, pois, conheço do apelo, presentes os requisitos de admissibilidade e lhe dou provimento, para declarar a insubsistência do feito fiscal.
É como voto.
Plenário Antônio Pinto da Silva em 23 de março de 1995.
a) Luiz Fernando Mussolini Júnior, Juiz Relator.
Resumo da Decisão: Pedido de Revisão do contribuinte - Provido - Decisão não unânime - Processo DRT-1 nº 8607/91, julgado em sessão de CC.RR. de 23.03.95.