RELATÓRIO
A empresa foi autuada, em ação fiscal, acusada de ter deixado de recolher o Imposto devido, por registrar operações tributadas, como não tributadas e errar a aplicação de correta base de cálculos.
A autuada defende-se, levantando em preliminar a invalidade da presente autuação fiscal, com base do disposto no artigo 21, incisos VIII e IX, da Constituição Federal de 1967, e Emenda nº 1 de 1969. E que a nova Carta de 1988, no artigo 34 da ADCT, embora tenha retirado da esfera Federal a tributação dos derivados de petróleo, atribuía à lei, no prazo de 30 dias, sua tributação pelo Estado. E a Lei nº 6.374/89, que disciplinou a matéria, só entrou em vigor em 31-03-89, não podendo, portanto, autuar as operações, antes desta data.
E, no mérito, alega que o AFR, efetuou o cálculo do imposto a pagar, sem considerar o crédito do imposto, pelas aquisições das mercadorias, que teria direito, em decorrência do princípio da não cumulatividade.
Assim é que o auto inicial carece de fundamentação legal, porque em primeiro lugar, pretendeu exigir ICMS de querosene e aguarrás, antes de 31.03.89, o que estava vedado por disposição Constitucional. Segundo, porque não considerou os créditos devidos; terceiro, porque assim procedendo o imposto tornou-se cumulativo e quarto porque se a ação fiscal tivesse considerado os créditos presumidos, restaria comprovada a inexistência do débito reclamado. E afinal espera que o auto inicial seja cancelado.
O AFR, em sua manifestação, sustenta que os produtos comercializados pela autuada (removedor) são produtos industrializados, não utilizados como combustíveis e, portanto, sujeitos à tributação do ICM/ICMS. E para ilustrar esta tese, junta o Ofício DEAT/G nº 929/88, que deve orientar as ações fiscais externas, reproduzindo o entendimento deste E. Tribunal a respeito do assunto (Processo DRT-5 n°3665/84). No que diz respeito à alegação de mérito, sobre direito de crédito, cabe ao interessado pleitear seus direitos.
O julgamento do feito, avocado pelo d. Delegado Regional (DRT/3-G), tomando por base o entendimento da d. Consultoria Tributária, contida no expediente GIN 311/85, conclui pela procedência da acusação fiscal, mantendo o auto inicial.
A recorrente inconformada, em bem elaboradas razões de recurso, sustenta sua posição anterior da improcedência do auto mantido pela decisão "a quo". E finaliza alegando que não houve inobservância das normas concernentes à legislação do ICMS; não houve falta de recolhimento do imposto e nem prejuízo ao Fisco; razão pela qual pretende seja a exordial julgada insubsistente. E protesta ainda por sustentação oral.
Em nova manifestação, o AFR autuante, mais uma vez, contesta a posição da recorrente, sustentando que o querosene comercializado pela empresa destina-se a ser utilizado como removedor, ou produto de limpeza, e não como combustíveis ou lubrificantes. E, que apesar da autuação ter sido devida em razão desta classificação, a citada Lei nº 6.374/89, data de 01.03.89. E que se há crédito devido a reclamar, compete ao interessado fazê-lo, tal como fizeram seus clientes. Isto posto pede a manutenção do feito.
Este é o breve relatório.
Face ao pedido de sustentação oral, deixo de proferir meu voto, para fazê-lo posteriormente à manifestação da recorrente.
CONCLUSÃO DE VOTO
Apesar de regularmente notificada a recorrente não se fez representar para proceder à sustentação oral requerida. De modo que, observada a Portaria CAT n° 36/89, passo ao voto.
É certo que a hipótese dos autos trata de matéria conflitante, apesar de não mais estar sujeita ao IULCLG, em virtude da extinção deste tributo.
Mas, para que a corrente que defende a destinação do uso, como limite para definir o querosene e a aguarrás, como produtos industrializados, sujeitos ao IPI e ao ICM.
Prefiro acompanhar a corrente que entende estarem os lubrificantes e combustíveis, sujeitos a incidência destes tributos, após o comando da Constituição de 1988.
Vale isto dizer que até a data de vigência da Carta de 1.988, estes produtos estavam fora do campo de incidência do ICM/ICMS; sendo ainda irrelevante a destinação do produto.
Assim é que somente as operações a partir de 31 de março de 1989 ficam sujeitas ao imposto, consoante estabelece o parágrafo 6º do artigo 34 das Disposições Transitórias da CF/88 e em consonância com a Lei nº 6.374, de 1º de março de 1989.
E a partir da incidência tributária do ICMS, nestas operações é indiscutível o direito de crédito da recorrente, face ao princípio da não cumulatividade.
Diante do acima exposto, voto no sentido de dar provimento parcial ao recurso interposto, para excluir da exordial a exigência do imposto e multa até a data de 31.03.89, mantendo no mais a decisão singular.
Sala de Sessões, em 06 de maio de 1994.
a) Roberto Mateus Ordine , Relator.
Voto em Separado
Pedi vista dos autos para um exame percuciente da controversa questão "sub judice" que respeita à falta de recolhimento do ICM/ICMS devido pelas operações realizadas em maio/88, janeiro/89, fevereiro/89, março/89 e maio/89 (item I.1), com querosene e aguarrás (removedor), registradas como não tributadas, bem como erro na aplicação de base de cálculo em operação efetuada com querosene, em 12.6.89 (item I.2), segundo consta na peça acusatória.
Entendo, como o ilustre relator, que o querosene e a aguarrás ("White Spirit"), no período que antecedeu o advento do novo Sistema Tributário Nacional, estiveram sob o campo de incidência do Imposto Único sobre Lubrificantes e Combustíveis Líquidos e Gasosos - IULCLG.
Com efeito, a partir de 1º de janeiro de 1967, com a instituição do Decreto-lei nº 61, de 21/11/66, o petróleo bruto foi retirado do campo de incidência do IULCLG, passando a ser tributados somente os derivados. Vários diplomas legais federais alteraram o DL nº 61/66, reajustando alíquotas e/ou acrescentando novos derivados à lista original.
A delimitação do campo de incidência do IULCLG se atinha a quatro pré-requisitos:
a) lubrificante e combustível;
b) nacional ou importado;
c) relacionado em lei;
d) com especificações baixadas pelo Conselho Nacional do Petróleo.
De acordo com o último pressuposto, o Conselho Nacional do Petróleo detinha a competência para baixar normas sobre as especificações técnicas dos produtos sobre os quais recaía o imposto único (§ 5º do artigo 1º da Lei nº 4.452/64, reafirmado pelo artigo 4º do Decreto-lei nº 1.296/73).
O querosene e a aguarrás ("White Spirit") foram relacionados expressamente em lei, inicialmente, no Decreto-lei nº 1.296/73, e mais recentemente, na Lei nº 7.451, de 26.12.85, como produtos sujeitos ao IULCLG.
Não se pode olvidar, aqui, que um produto sujeito ao imposto único somente pode ser tributado uma única vez, sobre uma das operações previstas no artigo 21, inciso VIII, da Constituição Federal de 1967, com a emenda nº 1, de 1969, quais sejam: produção, importação, circulação, distribuição ou consumo - da escolha do legislador competente para instituir o tributo, a União. Sujeito, pois, um produto, ao imposto único, fica excluída a incidência de qualquer outro tributo sobre as citadas operações.
O Parecer Normativo CST n° 52, de 31/5/78, ao examinar as implicações relacionadas ao IPI, cujo fato gerador, produção, operação prevista na CF para o IULCLG, seria também fato imponível daquele, assim concluiu sobre as várias situações que se apresentavam:
"5.5.1 - Numa primeira etapa:
a) os produtos alcançados pelo IULCLG (prenchendo todos os quatro pré-requisitos) estarão decisivamente preservados do alcance do IPI;
b) os produtos não alcançados pelo IULCLG (por não preencherem um ou mais dos quatro pré-requisitos) estão passíveis de ser atingidos pelo IPI.
5.5.2 - Em etapas seguintes:
a) os produtos alcançados pelo IULCLG que venham a sofrer novos processos de elaboração continuarão no campo de incidência do IULCLG se mantidos os quatro pré-requisitos. Não haverá, pois, novo IULCLG e o IPI estará afastado;
b) se não mais atendido qualquer um dos quatro pré-requisitos do IULCLG, aí sim, os produtos estarão vulneráveis ao alcance do IPI.
6. Resumindo, tem-se que estão sujeitos à incidência do IULCLG, todos os lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos, nacionais ou importados, relacionados na legislação de regência e que atenderem às especificações do CNP. Enquanto permanecer a incidência do IULCLG, quer numa primeira etapa, ou nas seguintes, estará excluída a do IPI, que, no entanto, poderá alcançar os produtos em qualquer etapa, se não tributados pelo imposto único e se estiverem em seu campo de incidência" (grifos nossos).
Solucionando dúvidas anteriormente existentes, o Coordenador do Sistema de Tributação, por meio do Ato Declaratório (Normativo) CST nº 2, de 25 de janeiro de 1978, declarou, em caráter normativo, que "a partir da vigência do Decreto-lei nº 1.296, de 26 de dezembro de 1973, a aguarrás ("White Spirit") e as várias espécies de "Naftas" foram incluídas no campo de incidência do imposto único sobre lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos ficando, em consequência, excluídas da incidência de qualquer outro tributo".
Vê-se, pois, que a destinação dos produtos, desde que atendidos os requisitos examinados, não se revela importante para a incidência do imposto único, uma vez que a tributação decorre da natureza intrínseca deles (produtos), e não em razão de sua utilização potencial.
A questão controversa, na realidade, se restringia à aguarrás, uma vez que a Consultoria Tributária, na resposta à Consulta nº 401/93, datada de 28/09/93, relativamente ao querosene, já expendeu seu entendimento no sentido de que, "embora utilizado no consumo doméstico, não deixa de ser combustível, derivado do petróleo, submetido à disciplina dos artigos 392 e seguintes do RICMS/91" (que tratam da sujeição passiva por substituição nas operações com petróleo, combustíveis ou lubrificantes dele derivados).
Com referência à aguarrás, a jurisprudência atual deste E.TIT tem decidido pela sujeição à incidência do IULCLG, no período anterior à vigência do sistema tributário atual, como se extrai dos seguintes julgados, dentre outros: Processos DRT-5 nº 8022/88, 7ª Câmara, 17/07/92 (Boletim TIT 272); DRT-3 nº 2856/91, 6ª Câmara, 30/07/92 (Boletim TIT 270); DRT-1 nº 19010/89, 8ª Câmara, 26/01/93; DRT-6 nº 220/90, 8ª Câmara; DRT-6 nº 4694/89, 2ª Câmara, 11/02/92; DRT-12 nº 2172/89, 7ª Câmara, 22/10/92 (Boletim TIT n°278-E 5234); DRT-6 nº 4696/89, 3ª Câmara, 09/04/92; DRT-6 nº 4508/89, 3ª Câmara, 15/10/91 e DRT-6 nº 0752/90, 1ª Câmara Especial, 12/02/93.
Da mesma forma o assunto já foi devidamente analisado pelo Supremo Tribunal Federal, que fulminou igual pretensão do Estado de Minas Gerais, ao negar provimento ao Agravo Regimental nº 140.862-6/MG, publicado no DJU de 05/06/92, página 8432, sob o fundamento de que "definido pelo Decreto-lei federal nº 1.296/73, que a "aguarrás" sofre a incidência do imposto único de competência da União, obviamente que tal incidência exclui a de qualquer outro tributo, só podendo ser afastada mediante prévia declaração de sua inconstitucionalidade, tendo-se em vista o que a respeito preceitua o artigo 21, inciso VIII, da Constituição de 1969, à época incidente".
No que tange às operações com querosene e aguarrás realizadas em março, maio e junho de 1989, portanto, após a entrada em vigor do novo sistema tributário nacional, em que os aludidos produtos, até então sujeitos ao imposto único, passaram para o campo de incidência do ICMS, alguns esclarecimentos se fazem de rigor, para justificar o voto que irei proferir.
Os combustíveis e lubrificantes, assim como a energia elétrica e os minerais, passaram a ser tributados pelo ICMS, de competência dos Estados e do Distrito Federal, a partir de 1º de março de 1989, "ex vi" do disposto no artigo 34, § 5º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Lei Maior, data fixada para entrada em vigor do novo sistema tributário nacional, ficando assegurada, no mesmo dispositivo, a aplicação da legislação anterior, naquilo que com ele e com as normas adotadas pelos Estados membros da Federação não fosse incompatível. Dessa forma, tratando-se de mercadoria, como outra qualquer, o combustível e o lubrificante sujeitam-se à incidência do ICMS desde 1º/03/89 (artigo 114 da Lei nº 6.374/89), observadas as disposições legais vigorantes sobre a matéria.
Nessa fase de transição, releva notar a dificuldade que os contribuintes sem dúvida enfrentaram para absorver e aplicar a legislação tributária estadual, uma vez que as inúmeras normas que disciplinaram a incidência do ICMS sobre combustíveis e lubrificantes foram publicadas após a sua vigência, com efeito retroativo, o que, sem dúvida, é de ser considerado pelo julgador.
Fazendo uma retrospectiva da legislação que regulou a matéria, à época, temos:
- O Convênio ICM-37, de 27/02/89 (DOU de 28/02/89), que entrou em vigor na data da publicação de sua ratificação nacional (ocorrida pelo Ato Declaratório nº 3, de16/03/89, publicado no DOU de 17/03/89), cujos efeitos retroagiram a 1º de março de 1989 em que os Estados e o Distrito Federal acordaram em conceder, até 31/03/89, redução da base de cálculo do ICMS, nas saídas tributadas de petróleo, lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, entre os quais foram incluídos o querosene (item VII do § 1º da cláusula primeira), e a aguarrás mineral (item IX do § 1º da cláusula primeira).
Muito embora o caráter impositivo do Convênio ICM-37/89, o Estado de São Paulo, ao implementá-lo pelo Decreto nº 29.778, de 29/03/89 (DOE de 30/03/89), não incluiu a aguarrás entre os produtos beneficiados pela redução de base de cálculo, conquanto tenha inserido o querosene (item II do artigo 7º). Ademais, o dispositivo em referência (item II do artigo 7º) teve sua redação alterada pelo inciso II do artigo 1º do Decreto nº 29.855, de 26/04/89 (DOE de 27/04/89), modificação essa com efeito a partir de 1º de março de 1989 (artigo 67).
Posteriormente, com a prorrogação, até 30/04/89, dos benefícios concedidos pelo Convênio ICM-37/89, pelo Convênio ICMS-25, de 28/3/89 (DOU de 30/03/89), com vigência a partir da sua ratificação nacional (que se deu pelo Ato Declaratório 5, de 18/04/89 - DOU de 19/04/89), e efeitos a partir de 1º/04/89, o Estado de São Paulo igualmente estendeu o disposto no artigo 7º do Decreto nº 29.778/89, até 30/04/89, pelo artigo 6º do Decreto nº 29.948, de 19/05/89 (DOE de 20/05/89, com republicação no DOE de 23/05/89, e retificações nos DOEs de 25/05/89 e 30/05/89).
A redução em foco era de aplicação opcional pelo contribuinte, e implicava na utilização somente de crédito do imposto correspondente à entrada da mesma mercadoria. Por sua vez, o artigo 8º do Decreto nº 29.778, de 29/03/89, permitiu aos estabelecimentos distribuidores e aos varejistas creditar-se da importância resultante da aplicação da alíquota interna sobre o preço de venda a consumidor fixado pelo Conselho Nacional de Petróleo - CNP, com a redução prevista no artigo anterior, em relação aos estoques dessas mercadorias existentes em 28 de fevereiro de 1989, desde que sujeitas ao pagamento do imposto sobre circulação de mercadorias.
Por fim, o Comunicado CAT n° 10, de 28/02/89 (DOE de 1º/03/89, com republicação no DOE de 7/03/89) esclareceu o tratamento tributário aplicável a partir de 1º/03/89, entre outras mercadorias, com o petróleo e seus derivados e demais lubrificantes líquidos ou gasosos ( vigência e redução de base de cálculo).
Após essa verdadeira miscelânea de atos legais que, diga-se, referem-se apenas aos dois primeiros meses de vigência da incidência do ICMS sobre combustíveis e lubrificantes, não vemos como apenar o contribuinte pelas dúvidas que possa ter tido na aplicação dessa legislação!
Examinada, pois, a legislação aqui referida, extrai-se que a exigência do ICMS relativa aos meses de março, maio e junho de 1989, constante no auto inaugural, não se reveste de certeza e liquidez quanto ao montante do crédito tributário exigido, tendo em vista que o Fiscal autuante sequer separou as operações por produto (querosene e aguarrás), que tiveram, no período considerado, tratamentos tributários diferentes. Além do mais, como a recorrente teria direito ao crédito do imposto relativo ao estoque existente em 28/02/89, do seu procedimento nenhum prejuízo teria resultado ao Estado naqueles períodos.
Entendo, pois que a infração praticada limitar-se-ia a uma falta de caráter formal, meramente regulamentar (falta de destaque, nos documentos fiscais, do valor do ICMS correspondente), com multa prevista no artigo 85, IV, "h" da Lei nº 6.374/89, e esta estaria cancelada pelo artigo 9º da Lei nº 7.646/91.
Isso, posto, com a devida vênia do ilustre Relator, meu voto é no sentido de dar integral provimento ao recurso, pelos argumentos e fundamentos aqui alinhados.
Sala das Sessões, em 29 de junho de 1994.
a) Célia Barcia Paiva da Silva, Juíza com vista.
Considerando a profundidade do voto prolatado pela ilustre juíza Dra. Célia Barcia Paiva da Silva, reformulo meu voto para dar integral provimento ao recurso.
a) Roberto Mateus Ordine, Relator
Resumo da Decisão - Recurso Ordinário - Provido Integralmente - Decisão Unânime - 6ª Câmara Especial - Processo DRT-1 nº 17.408/90