Este capítulo trata de assunto que enseja muitas interpretações, às vezes conflitantes, no momento de operacionalizar a tributação e a fiscalização. Falar-se-á sobre a incidência do ICMS, focalizando os vários momentos de ocorrência do fato gerador e esclarecendo dúvidas de entendimento e aplicação do texto legal.
Competência Atribuída pela Constituição Federal
O campo de incidência de um tributo é definido, na origem, pela própria Constituição Federal. A Constituição não cria o tributo, apenas atribui ao Estado a competência para que o faça. Vejamos, então, o artigo 155 da Constituição Federal:
DOS IMPOSTOS DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL
"Artigo 155 - Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir:
I - impostos sobre:
...
b) operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;"
(Constituição Federal)
Como vimos, o Estado está autorizado a tributar as operações relativas à circulação de mercadoria e também, a partir da Constituição de 1988, as prestações de serviço. Mas não toda prestação de serviço. Somente aquela relativa ao transporte interestadual ou intermunicipal ou a serviço de comunicação.
Fato Gerador do ICMS
A partir da atribuição de competência pela Constituição, o Estado cria o imposto mediante lei ordinária. Já o regulamento do imposto, aprovado por decreto do Governador, reproduz a obrigação principal criada pela lei e prevê as obrigações acessórias que também devem ser cumpridas pelos contribuintes.
Diz o artigo 1º do regulamento do ICMS do Estado de São Paulo:
"Artigo 1º - O Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS - tem como fato gerador a operação relativa à circulação de mercadoria ou a prestação de serviço de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação, ainda que a operação ou a prestação se inicie no exterior.
Parágrafo único - O imposto incide também sobre a entrada de mercadoria importada do exterior, ainda que se trate de bem destinado a consumo ou a ativo imobilizado do estabelecimento, assim como sobre o serviço prestado no exterior."
(RICMS)
O artigo 1º detalha o fato gerador do ICMS, que tem como tipificação a operação - quando se refere a mercadoria, e a prestação - quando se refere a serviço de transporte interestadual ou intermunicipal ou a serviço de comunicação.
Mesmo que a operação ou a prestação se inicie no exterior, ocorrerá a incidência do imposto. Quando a legislação diz "operação iniciada no exterior", refere-se à importação. Já quando diz "prestação de serviço iniciada no exterior", não se refere ao serviço de transporte, porque o transporte internacional está fora do campo de incidência; abrange apenas o serviço de comunicação. Por exemplo: uma ligação a cobrar vinda de fora do país é uma prestação de serviço iniciada no exterior e sujeita ao ICMS.
O parágrafo único deixa claro que a importação está abrangida nas hipóteses de ocorrência do fato gerador, como aliás a própria Constituição explicita no inciso X, alínea "a" do § 2º do artigo 155.
Ocorrência do Fato Gerador
Diz o artigo 2º do regulamento do ICMS:
"Artigo 2º - Ocorre o fato gerador do imposto:..."
(RICMS)
O caput do artigo 2º começa dizendo: "Ocorre o fato gerador do imposto...". Mas, como vimos, o artigo 1º já definiu o fato gerador! No artigo 2° apenas serão listados os momentos em que se visualiza a ocorrência do fato gerador; trata-se da exteriorização do fato gerador.
Momentos da Ocorrência do Fato Gerador
O inciso I do artigo 2º traz o fato gerador que mais freqüentemente se verifica na prática: a saída de mercadoria a qualquer título.
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
I - na saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;"
(RICMS)
O simples fato de a mercadoria sair do estabelecimento de contribuinte já caracteriza o fato gerador. Não importa se a venda se efetivou ou não, mas sim se ocorreu a circulação da mercadoria; trata-se de uma situação de fato, não simplesmente de uma situação jurídica.
Em relação à saída de mercadoria, serão a seguir analisadas algumas situações que em geral trazem dúvidas.
Venda de Filial
Quando uma empresa vende uma filial, um estabelecimento por inteiro, ocorrerá o fato gerador? Não! Não se caracteriza a circulação da mercadoria. Nem há necessidade de emissão de nota fiscal. Basta um rol da mercadoria, anexo ao contrato de transmissão de propriedade do estabelecimento. Mesmo que a venda seja parcial, não há circulação física de mercadoria e não ocorre o fato gerador do ICMS.
Mudança de Endereço do Estabelecimento
Na mudança de endereço de uma empresa há circulação física de mercadoria; mas, mesmo assim, não se caracteriza o fato gerador do ICMS, porque ocorre a transferência de toda a empresa, isto é, do estabelecimento como um todo.
Aquisição de Pomar ou de Árvores em pé
Quando uma empresa adquire terreno com árvores em pé, ou pomar com árvores carregadas de frutos, não se cogita de fato gerador do ICMS. Este somente ocorrerá no momento em que houver a saída da madeira resultante ou a venda dos frutos após a colheita.
Salvados de Sinistro
Quanto aos salvados de sinistro, a Lei Complementar 87/96 inovou ao declarar a não-incidência do ICMS na transferência para a seguradora. O entendimento anterior a essa lei era que ocorria o fato gerador do ICMS na transmissão de propriedade de bens sinistrados para a seguradora. Na época, orientava-se o contribuinte para que a nota fiscal fosse emitida pelo valor residual da mercadoria e sobre esse valor deveria ser calculado o imposto. Caso se tratasse de sucata, poderia haver a aplicação do diferimento específico.
Não se deve confundir, porém, a transferência do bem sinistrado para a seguradora com a indenização paga ao segurado. A diferença entre o valor da indenização e o da nota fiscal emitida pelo valor residual do bem já não tinha implicações fiscais, mas somente contábeis, mesmo antes da edição da Lei Complementar 87/96.
Roubo de Veículo do Ativo
Não há que falar em fato gerador de ICMS nem de emissão de nota fiscal. No caso de roubo de bem de ativo, simplesmente com o boletim de ocorrência policial, procede-se à baixa do bem na escrita comercial.
Caso o veículo tenha sido adquirido posteriormente a 1°/11/96, é preciso verificar se houve aproveitamento de crédito quando da aquisição. Em caso positivo, pode haver necessidade de estorno parcial desse crédito, conforme previsto na Lei Complementar 87/96.
Consignação
A consignação entre contribuintes é tributada normalmente. Imaginemos que uma indústria remeta mercadoria em consignação para um varejista. A operação é tributada. Sai tributada a remessa em consignação, e, em caso de devolução por não ter sido concretizada a venda, o varejista devolverá a mercadoria também tributada, e a indústria poderá lançar o crédito correspondente. Tem-se hoje, no artigo 463-A e seguintes do regulamento, a disciplina para essas operações.
Mas, e quando uma loja de veículos usados recebe de um particular um veículo para ser vendido em consignação?
Ora, a operação efetuada por não-contribuinte está fora do campo de incidência. O fato gerador ocorre na saída da mercadoria pela loja quando se efetivar a venda. Caso a loja devolva o veículo ao particular, por não ter sido concretizada a venda, também não se fala em tributação. Isso, porém, tão-somente quando a devolução resultar da não-realização da venda. Se houver simulação de devolução de consignação, tendo a venda ocorrido, haverá crime contra a ordem tributária, que, sem prejuízo das sanções tributárias, deverá ser enquadrado na legislação penal específica.
Exportação
Entre os momentos de ocorrência do fato gerador, relacionados no artigo 2° do RICMS, não é mencionada a exportação, porque nesse caso o fato gerador é a própria saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte e não o embarque para a exportação. Sendo tributada a exportação, a conversão da moeda será feita pela cotação na data da saída do estabelecimento, que é, conforme acima referido, a data do fato gerador.
Estabelecimento em Área Contínua
Diz o inciso II do artigo 2º:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
II - na saída de mercadoria de estabelecimento extrator, produtor ou gerador para qualquer outro estabelecimento, de idêntica titularidade ou não, localizado na mesma área, em área contínua ou diversa, destinada a consumo ou a utilização em processo de tratamento ou de industrialização, ainda que as atividades sejam integradas;"
(RICMS)
A interpretação desse inciso muitas vezes gera dúvidas. É importante entender que se trata de situação em que a mercadoria está saindo de um estabelecimento para outro. Não importa se o outro estabelecimento se localiza em área contínua ou não; não importa se esse outro estabelecimento é ou não do mesmo contribuinte. O que importa é que são estabelecimentos distintos, com inscrições diferentes. Cada um deles, para fins de legislação do ICMS, é tratado separadamente.
Se, por exemplo, uma empresa faz, em um estabelecimento, a extração de minério e, para continuar o processo de industrialização, remete-o a outro estabelecimento, da mesma empresa ou não, em área contínua ou não, tem-se o fato gerador caracterizado. O parâmetro é a saída para outro estabelecimento. Porém, se as atividades forem integradas, mas dentro do mesmo estabelecimento, só ocorrerá o fato gerador na saída desse estabelecimento.
Fornecimento de Alimentação
Diz o inciso III do artigo 2°:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
III - no fornecimento de alimentação, bebida ou outra mercadoria por qualquer estabelecimento, incluídos os serviços que lhe sejam inerentes;"
(RICMS)
Aqui está especificamente previsto o fornecimento de alimentação e bebida, ou, simplesmente, fornecimento de alimentação, que no passado tantos problemas trouxe à fiscalização.
Inicialmente, na época do ICM, argumentava-se que não havia previsão de fato gerador para o fornecimento de alimentação. Isso foi corrigido, mas os restaurantes continuaram a questionar em juízo a cobrança, alegando, então, ausência de previsão de base de cálculo específica. Como se sabe, o fato gerador e a base de cálculo devem estar expressamente previstos em lei, e a lei previa a base de cálculo apenas para "saída de mercadoria" e não para o "fornecimento de alimentação". Também essa falha foi sanada no tempo do ICM, mediante inclusão no Decreto-Lei 406/68.
A legislação do ICMS já nasceu livre dessas imperfeições, com a devida previsão de fato gerador e base de cálculo no Convênio ICMS 66/88, na Lei Complementar 87/96 e também nas leis estaduais.
Um lembrete: muitos insistem em considerar que o fornecimento de refeições deveria ser tributado pelo ISS. A Constituição, porém, determina que os serviços tributados pela Prefeitura sejam definidos em lei complementar, e a Lista de Serviços trazida pela Lei Complementar 57/86 não contempla essa atividade.
Cozinha Industrial
Quando as refeições saem prontas de cozinha industrial para serem servidas em outro local, não ocorre o fato gerador previsto no inciso III, "fornecimento de alimentação", mas sim aquele previsto no inciso I, "saída de mercadoria".
O inciso III só se aplica quando a mercadoria é consumida no próprio estabelecimento que a produz. É o caso de restaurantes. Também é o caso de empresa de cozinha industrial que abra filial em estabelecimento de cliente, onde a refeição será preparada e servida.
A alíquota e os benefícios previstos para o fornecimento de refeições não poderão ser utilizados na venda de refeições prontas ou de comida congelada.
Cabe ressaltar que a legislação paulista estende a alíquota de 12% e a redução de 30% na base de cálculo às saídas promovidas por empresas preparadoras de refeições coletivas.
Fornecimento de Refeições a Bordo
Outra questão interessante refere-se às empresas de transporte que fornecem refeições a bordo, gratuitamente. Ora, se a refeição está incluída no preço da viagem, não há que cogitar de fato gerador do ICMS, por se tratar de atividade resultante de outra, considerada principal, que é o transporte dos passageiros. Entretanto, se houver serviço opcional, com venda de bebidas a bordo, aí sim se caracteriza o fornecimento de bebidas ou de refeições, e, então, ocorre o fato gerador do imposto.
Gorjeta para Garçom
Na questão das refeições surgem dúvidas também quanto à gorjeta que se dá a garçom. Se a empresa apresenta a conta com a gorjeta inclusa, a base de cálculo do imposto será o total da conta, que, conforme já dito, inclui a gorjeta. Mas se esta for opcional, trata-se de algo entre o cliente e o garçom; no caso, o valor estará excluído da base de cálculo do imposto.
Fornecimento de Mercadoria com Prestação de Serviço
Diz o inciso IV do artigo 2°:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
IV - no fornecimento de mercadoria com prestação de serviço:
a) não compreendido na competência tributária do município;
b) compreendido na competência tributária do município, mas que, por indicação expressa de lei complementar, se sujeitar à incidência do imposto de competência estadual;"
(RICMS)
No inciso IV, tem-se duas situações.
Se o serviço não estiver na competência do Município, ou seja, se não constar na Lista de Serviços, incidirá ICMS sobre o valor total da operação (mercadoria + serviço).
Mas, e se constar na lista dos serviços tributados pela Prefeitura? Nesse caso, incidirá o ISS, salvo se a Lista de Serviços apresentar uma exceção, situação em que incidirá o ICMS. Como exemplo, pode-se mencionar o conserto de qualquer bem: incide ICMS sobre peças e partes fornecidas. Trata-se da "indicação expressa de lei complementar" de que fala o regulamento, ou seja, de exceção prevista na Lista de Serviços.
A esse assunto, bastante complexo, este livro dedicará um capítulo específico, que focalizará a Lista de Serviços e as peculiaridades do relacionamento ICMS / ISS.
Importação
Dizia o inciso V do artigo 2° do regulamento paulista, antes da edição da Lei Complementar 87/96:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
V - no recebimento, pelo importador, de mercadoria ou bem importado do exterior, observado o disposto nos §§ 3º e 5º;"
(RICMS)
Trata-se da importação de mercadoria, que a própria constituição prevê como fato gerador do ICMS.
Antigamente, considerava-se que o fato gerador ocorria na entrada da mercadoria no estabelecimento do contribuinte. Depois, pelo Convênio 66/88, ficou facultado a cada Estado escolher: a data do recebimento da mercadoria ou a da entrada dessa mercadoria no estabelecimento do contribuinte.
O Estado de São Paulo, ao elaborar sua legislação, fixou como instante da ocorrência do fato gerador o momento do recebimento, pelo importador, da mercadoria importada. Essa interpretação foi corroborada pelo Supremo Tribunal Federal - STF que, em setembro de 1996, julgou o R.E. 193.817-RJ, decidindo, com respaldo no Convênio ICM 66/88, pela legalidade do aspecto temporal do fato gerador previsto no momento do desembaraço (recebimento pelo importador).
Entendia-se, então, como recebimento da mercadoria o momento em que o importador, juridicamente, tomava posse do bem importado: ao assinar o campo "Recebimento dos Produtos" no Anexo 1 da Declaração de Importação. Assim sendo, até a edição da Lei Complementar 87/96, considerava-se que o fato gerador ocorria no momento da posse da mercadoria e não no momento em que ela entrava fisicamente no estabelecimento do importador. Popularmente já se dizia: "o fato gerador do ICMS ocorre no desembaraço". Mas isso porque normalmente a data do desembaraço coincide com a data do recebimento dos volumes.
Atualmente, vale a definição dada pela Lei Complementar 87/96: o fato gerador do ICMS, na importação, ocorre no momento do desembaraço da mercadoria importada do exterior (artigo 12, inciso IX). Vejamos a nova redação dada ao inciso V do artigo 2° do RICMS:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
V - no desembaraço aduaneiro de mercadoria ou bem importado do exterior;"
(RICMS)
Importador Não-Contribuinte
Já houve muita polêmica sobre a importação de mercadoria por pessoa física ou por não-contribuinte. Porém, até mesmo por razões de isonomia, a tributação aplica-se igualmente, seja o importador contribuinte ou não. Por isso, os Estados entendem que haverá tributação pelo ICMS sobre qualquer produto importado, seja o importador contribuinte ou não. O regulamento paulista prevê, inclusive, que para este fato gerador - importação - não se exige a habitualidade: bastou importar uma vez, é devido o imposto.
Empresa não-contribuinte, uma instituição financeira, por exemplo, não recolhe ICMS. Mas se importar equipamento para seu próprio uso, uma só vez que seja, estará sujeita ao ICMS nessa operação.
Esse assunto também foi tratado pela Lei Complementar 87/96, firmando-se o entendimento que já era adotado pelos Estados.
Desembaraço de Mercadoria em Outro Estado
Uma situação bastante polêmica é a seguinte: a Constituição prevê que o ICMS na importação destina-se ao Estado onde está localizado o importador. No caso de Estado que não tenha porto, por exemplo, e que desembarace em porto paulista: o ICMS deverá ser recolhido por Guia Nacional de Recolhimento de Tributos e repassado integralmente ao Estado onde se localiza o importador.
Pode ocorrer, entretanto, que uma mercadoria, importada por empresa de outro Estado, seja desembaraçada em São Paulo e não siga para aquele Estado, permanecendo em São Paulo e sendo aqui mesmo comercializada.
Entende a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, inclusive respaldada por decisão do Tribunal de Alçada Civil do Estado, que, havendo a circulação da mercadoria sido feita integralmente neste Estado, o imposto será devido ao tesouro paulista.
Da mesma forma, se empresa paulista desembaraçar mercadoria em porto de outro Estado, e a circulação da mercadoria ocorrer integralmente fora do Estado de São Paulo, não será devido ICMS para o Estado de São Paulo.
A Lei Complementar 87/96 também disciplina dessa forma ao determinar que, no caso da importação, para efeito de cobrança do imposto e de definição do estabelecimento responsável, o local da operação é o do estabelecimento onde ocorrer a entrada física (artigo 10, I, "d").
Licitação de Mercadoria Importada e Apreendida
Diz o inciso VI do artigo 2°:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
VI - na aquisição, em licitação promovida pelo Poder Público, de mercadoria ou bem importado do exterior e apreendido;"
(RICMS)
A Receita Federal, ao flagrar situação de descaminho ou de contrabando, apreende a mercadoria e, posteriormente, dela realiza leilão.
Cabe ao arrematante no leilão, no momento da arrematação, o pagamento do ICMS, calculado sobre o valor da arrematação e incluídos os impostos federais.
Interessante que, quando o fisco estadual apreende mercadoria estrangeira sem documento fiscal, fruto de descaminho, não cobra o ICMS e tampouco aplica a multa, mas deve imediatamente entregá-la à Receita Federal.
A legislação federal prevê o perdimento da mercadoria pelo detentor e o Estado receberá o ICMS somente no momento da nacionalização da mercadoria, ou seja, no arremate em leilão.
Diferencial de Alíquota - Aquisição Interestadual de Bem de Ativo ou de Material de Consumo
Para estudar o diferencial de alíquota nas aquisições interestaduais de bem de ativo ou de material de consumo, deve-se iniciar pelo exame do inciso VII do artigo 2° do RICMS:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
VII - na entrada no estabelecimento de contribuinte, de mercadoria oriunda de outro Estado, destinada a consumo ou a ativo imobilizado;"
(RICMS)
Trata-se aqui de ficção legal, respaldada pela própria Constituição, que determina a utilização de alíquota interestadual na operação que destine bens de ativo ou material de consumo a contribuinte de outro Estado, cabendo o diferencial de alíquota ao Estado do destinatário. Assim sendo, o contribuinte paulista deverá recolher a São Paulo a diferença entre os 12% da operação interestadual e a alíquota interna daquela mercadoria.
Esse inciso oferece muitas dúvidas porque trata de obrigação do contribuinte inscrito e verdadeiramente definido como tal. Para sua perfeita interpretação, faz-se necessário inicialmente analisar o conceito de contribuinte pois somente o contribuinte paga diferencial de alíquota na aquisição interestadual de bens para consumo ou ativo. Empresa não-contribuinte não se torna contribuinte apenas por comprar ativo fixo ou material de consumo de outro Estado.
Conceito de Contribuinte e Habitualidade
No entendimento do Estado de São Paulo, não basta estar inscrito no Estado para ser contribuinte. A lei paulista estabelece que contribuinte do imposto é aquele que pratica com habitualidade o fato gerador do imposto.
É o que está previsto no artigo 9º, caput, do regulamento do ICMS paulista:
"Artigo 9° - Contribuinte do imposto é qualquer pessoa, natural ou jurídica, que de modo habitual ou em volume que caracterize intuito comercial, realize operações relativas à circulação de mercadorias ou preste serviços de transporte interestadual ou intermunicipal ou de comunicação."
(RICMS)
A palavra chave é: habitualidade na prática do fato gerador. Portanto, a inscrição estadual por si só não define quem é ou não contribuinte do tributo.
O que costumava gerar dúvida era a lista apresentada no § 1° do artigo 9º do RICMS paulista, em cujo caput se lia: "Incluem-se entre os contribuintes do imposto...". Tratava-se de lista meramente exemplificativa: mencionava pessoas que se revestem da condição de contribuintes quando se enquadram na situação de habitualidade na prática do fato gerador. Porém, essa lista foi excluída do RICMS pelo Decreto 41.957/97, que deu nova redação ao artigo 9°, adaptando-o à Lei Complementar 87/96.
Empresa de Leasing que Adquire Ativo de Outro Estado
A empresa de leasing, apesar de possuir inscrição no Estado, não se caracteriza como contribuinte, pois seu objetivo social é o arrendamento de bens, atividade sob o campo de incidência do ISS.
Operações interestaduais de venda de bens ou mercadoria, com destino a empresas de leasing, deverão ser feitas pela alíquota cheia e não haverá que falar em diferencial de alíquota.
Contudo, esse entendimento relativo às empresas de leasing está sendo alterado, pois a Lei Complementar 87/96 prevê a incidência do imposto na "venda do bem arrendado ao arrendatário" (artigo 3°, VIII). Sobre o assunto, os Estados firmaram o Convênio ICMS 4/97, que autoriza a concessão de isenção do imposto nesses casos.
Armazém Geral ou Órgão Público que Adquire Ativo de Outro Estado
O armazém geral deve ter inscrição no Estado porque, em muitas ocasiões, deve recolher o ICMS, não como contribuinte, mas como responsável por outro contribuinte. Assim sendo, embora inscrito, não se caracteriza como contribuinte; portanto não há diferencial de alíquota devido nesse caso.
Da mesma forma, operações interestaduais com destino a órgão público deverão ter alíquota cheia e também aqui não cabe falar em diferencial de alíquota.
Aquisição de Bem de Ativo Gravada por Isenção
Quando, em operação interestadual, mercadoria vem para contribuinte paulista gravada por uma isenção ou por uma não-incidência no Estado de origem, fica impossibilitada a cobrança do diferencial de alíquota, porque não se pode falar em diferença quando só há uma alíquota, a interna.
Microempresa que Adquire Ativo de Outro Estado
Quando microempresa paulista adquire bem de ativo ou material de consumo de outro Estado, não está sujeita ao pagamento do diferencial de alíquota, dada a abrangência do texto legal que lhe confere isenção. Diz o artigo 1º da Lei 6267/88: "Ficam isentas do ICM as operações realizadas por microempresa". Como o termo operações abrange tanto saídas como entradas, ficam isentas também as entradas de bem de ativo ou material de consumo recebidos de outro Estado, com relação ao pagamento do diferencial de alíquota.
Serviço de Transporte Interestadual e Intermunicipal
O transporte interestadual e o transporte intermunicipal entraram na competência dos Estados a partir da Constituição de 1988. É importante ressaltar que apenas os serviços de transporte interestadual e intermunicipal estão sujeitos à tributação pelo ICMS, ficando excluídos o transporte intramunicipal e internacional.
Diz o inciso VIII do artigo 2° do regulamento paulista:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
VIII - na execução de serviço de transporte interestadual ou intermunicipal;"
(RICMS)
Como o ICMS sobre os serviços de transporte apresenta muitas peculiaridades importantes, esse assunto será tratado posteriormente, em capítulo específico.
Serviços de Comunicação
As diversas formas de serviço de comunicação são tributadas pelo ICMS. Diz o inciso IX do artigo 2° do RICMS:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
IX - na geração, emissão, transmissão, retransmissão, repetição, ampliação ou recepção de comunicação de qualquer natureza, por qualquer processo, ainda que iniciada ou prestada no exterior, exceto radiodifusão, observado o disposto no § 7º;"
(RICMS)
Observe-se que a lei paulista exclui os serviços de radiodifusão. Convém esclarecer que o termo radiodifusão não se refere apenas às emissoras de rádio.
Para melhor entendimento, torna-se necessário estudar o conceito de radiodifusão.
Conceito de Radiodifusão
Definição de radiodifusão constante na legislação federal:
RADIODIFUSÃO
"É o serviço de telecomunicação que permite a transmissão de sons (radiodifusão sonora) ou transmissão de sons e imagens (televisão) destinado a ser direta e livremente recebida pelo público."
(Decreto 52.026, de 20/05/63, Regulamento Geral do Código Brasileiro de Telecomunicações, artigo 6º, item 26)
Assim sendo, as transmissões livres, tanto de rádio como de TV, foram excluídas da incidência do ICMS pela lei paulista.
Serviço Local de Difusão Sonora
Foi acrescentado ao regulamento, no Anexo I da tabela I, o item 51, que prevê isenção de ICMS por prazo indeterminado para a prestação de serviço local de difusão sonora. Esse benefício entrou em vigor a partir de 1°/01/97 e está condicionado à divulgação gratuita de matéria relativa ao imposto, no interesse do fisco e para informar a população, com vistas ao combate à sonegação.
TV a Cabo ou por Assinatura
Para a transmissão enquadrar-se no conceito de radiodifusão, há necessidade de atender ao seguinte parâmetro: "ser direta e livremente recebida pelo público". Com isso, fica excluído do benefício o serviço de TV a cabo ou por assinatura, que é tributado normalmente.
As prestações de serviço de televisão por assinatura, incluído o serviço de televisão a cabo, tem redução de base de cálculo concedida pelo CONFAZ, a partir de 27/04/95, estando sujeita à carga tributária efetiva de 5%. No regulamento paulista, essa situação está prevista no item 17 da tabela I do Anexo II.
Com respaldo no Convênio 39/95, São Paulo dispensou o pagamento de 80% do valor dos débitos fiscais de ICMS relacionados com o serviço de TV por assinatura, inclusive TV a cabo, prestado até 27/04/95, desde que o remanescente fosse recolhido até 30/09/95. Isso consta no artigo 7º do Decreto 40.228, de 28/07/95, com a aplicação do que o Código Tributário Nacional chama de Transação.
Conceito de Telecomunicação
Para ter idéia da amplitude do campo de incidência relativo a serviços de comunicação, é importante examinar o conceito de telecomunicação:
TELECOMUNICAÇÃO
"Constituem serviços de telecomunicação a transmissão, emissão ou recepção de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza, por fio, rádio, eletricidade, meios óticos, ou qualquer outro processo eletromagnético."
(Lei 4.117/62 - Código Brasileiro de Telecomunicações - artigo 3º)
Quem prestar esse tipo de serviço estará sujeito ao ICMS.
Diferencial de Alíquota - Prestação de Serviço Iniciada em Outro Estado
O inciso X do artigo 2° do RICMS prevê:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
X - na utilização, por contribuinte, de serviço cuja prestação se tiver iniciado em outro Estado e não estiver vinculada à operação ou prestação subseqüente alcançada pela incidência do imposto;"
(RICMS)
O mesmo raciocínio utilizado para o diferencial de alíquota nas aquisições interestaduais de bem de ativo ou de material de consumo vale para a prestação de serviço iniciada em outro Estado. Quando o contribuinte paulista contratar serviço iniciado em outro Estado, mas não vinculado diretamente à sua atividade de comércio ou de industrialização, deverá pagar a diferença entre a alíquota interna e a interestadual, para o Estado de São Paulo. Por exemplo: frete de ativo ou de material de consumo.
Com relação às prestações de serviço de transporte, exceto o aéreo, como em São Paulo a alíquota interna é igual à interestadual (12%), não existirá diferencial de alíquota.
O diferencial de alíquota somente será exigido nas prestações de serviço de transporte aéreo, uma vez que a alíquota interestadual dessas operações foi fixada em 4% pelo Senado Federal, e a partir de 1°/01/97, data em que se iniciou a cobrança do ICMS relativo ao transporte aéreo.
Operações Interestaduais com Energia Elétrica ou Petróleo, inclusive Lubrificantes ou Combustíveis Líquidos ou Gasosos Dele Derivados
Diz o inciso XI, acrescentado ao artigo 2° do RICMS para adaptar sua redação aos termos da Lei Complementar 87/96:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
XI - na entrada no território do Estado de energia elétrica ou de petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos ou gasosos dele derivados, oriundos de outro Estado, quando não destinados à comercialização ou à industrialização."
(RICMS)
Esse inciso foi inserido na lei complementar com o objetivo de dirimir discussões existentes desde a Constituição Federal de 88, que excluiu da tributação pelo ICMS as operações que destinem a outro Estado energia elétrica ou petróleo, inclusive lubrificantes ou combustíveis líquidos ou gasosos dele derivados. O objetivo constitucional é destinar todo o ICMS para o Estado em cujo território a mercadoria for consumida. Mas, na saída interestadual com destino a usuário final, como não haverá operação subseqüente no Estado destinatário, contribuintes passaram a questionar a exigência do fisco.
Esse assunto será tratado nos capítulos referentes a Lei Complementar 87/96 e Substituição Tributária - Produtos Envolvidos.
Serviço de Transporte Prestado ou Iniciado no Exterior
O inciso XII do artigo 2° prevê a ocorrência de fato gerador no serviço de transporte prestado ou iniciado no exterior:
"Artigo 2° - Ocorre o fato gerador do imposto:
...
XII - no recebimento, pelo destinatário, de serviço de transporte prestado no exterior e no ato final do transporte iniciado no exterior"
(RICMS)
Esse inciso foi acrescentado ao RICMS para adequação à Lei Complementar 87/96, que nos incisos VI e X do artigo 12 caracterizou as duas situações como momentos de ocorrência do fato gerador.
Contudo, não se vê possibilidade de aplicação dessas inovações conceituais que, s.m.j., ainda não trouxeram reflexos em termos de exigência do tributo.
Situações de Equiparação à Saída
O §1º do artigo 2° do RICMS traz algumas recomendações importantes:
"Artigo 2° - ...
...
§ 1º - Para efeito deste regulamento, equipara-se à saída:
1 - a transmissão de propriedade de mercadoria ou de título que a represente, quando esta não transitar pelo estabelecimento do transmitente;"
(RICMS)
Assim sendo, mesmo que a mercadoria não transite fisicamente pelo estabelecimento, o proprietário, ao vendê-la, deverá responder pela obrigação tributária.
Dois exemplos: a mercadoria negociada enquanto depositada em armazém geral e a venda à ordem, que ocorre quando o fornecedor remete a mercadoria para terceiro, por conta e ordem do primeiro comprador.
Finalmente, diz o item 2 do parágrafo acima citado:
"Artigo 2° - ...
...
§ 1º - Para efeito deste regulamento, equipara-se à saída:
...
2 - o uso, o consumo ou a integração no ativo imobilizado de mercadoria adquirida para industrialização ou comercialização, ou produzida pelo próprio estabelecimento;"
(RICMS)
No caso está previsto que, quando o contribuinte usar ou consumir mercadoria do seu estoque, isso será equiparado a uma saída. Inclusive, o artigo 174, inciso V, exige a emissão de nota fiscal, o que veio suprir o efeito do estorno de crédito que se fazia antigamente.
Contudo, como a equiparação não consta na Lei Complementar 87/96, a partir de novembro de 96 não mais é emitida nota fiscal nessa situação, razão pela qual o contribuinte deve estornar o crédito lançado por ocasião da entrada da mercadoria que teve a destinação alterada.
Extraido da obra "ICMS - TEMAS"
Autores:
José Roberto Rosa
Maria Regina Bertim